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Bangkok under a flashlight - interview with Tawanwad Wanavit

Tawanwad “Tang” Wanavit is a young Thai cinematographer, 29 years old, known on the internet also for his street photography. Born in Chiang Mai, a historic city in northern Thailand - the former administrative and religious center of the kingdom of Lanna, until 1558 -, he later moved to the capital, Bangkok, where he currently lives and where he finds, mainly in the suburbs, the characters and scenarios of his images.

Full of well-balanced elements, animals, flash lights and humor, Tang picture's, according to him, do not yield money. It's just a hobby. But in 2018, the pictures guaranteed him the award of APF street photography website, with over 140 million active followers, and the recognition of other important Thai street photographers, such as Tavepong Pratoomwong. "Tang’s photos are like watching blockbuster films. He uses a variety of techniques in a shot but that has never overlaid the focal point of the story he wants to tell with his lens. As a result, Tang’s photos are quite impactful and easily digestible for the viewers", said Tavepong in an interview about new promises from the Thai street photography scene, published on BK' website.

Member of the Full Frontal Flash collective, Tang says he's currently working on a project about his emotions. The idea is to transform a negative feeling into something positive, through photography, according to him. But he still doesn't know exactly how. 

In the following interview, the Thai street photographer, who recently had his Instagram account hacked and had to start it all over again, also talks about his photography career, creative routine and references in street photography.

When and how did your interest for photography started?

I have always been interested in images, but I took photography seriously when I was around 18-19 years old. It was my first Film Photography class. 

What attract you most in photography?

I’m attracted to the graininess, the harsh lights, and the spontaneousness in Photography. Everytime I see one of the elements, I can’t help but to approach it, maybe that’s one of the reasons why using Flashes attracts me, it always give me the harsh lights. 

How did you started taking pictures?

It started when I traveled to Japan with my mother. There were only two of us, I carried my camera with me everywhere, and because my mother loves Shopping so much I had to find some activity to do, so I started taking pictures of what was around me.

Where do you take pictures more frequently?

I take photographs mostly in places that’s not clean. I haven't found out the reason behind walking into these places yet, but I love dirty places that has local people living. 

How do you choose the themes and places you will photograph?

I don’t, I usually walk around and feel the place, I work instinctively most of the time. 

Could you please describe your routine when you are taking pictures?

I usually drive around to the other part of the town. Outside Bangkok there are usually open fields. I feel great when I’m around there, and when something strikes interest to me, I just park anywhere and walk down to shoot.

I like the way you build your pictures. Frequently something is misshapen in a funny way, that tricks who is looking at it, mixing the real and the unreal. Sometimes you put humans and animals in the same level. There are a lot of animals, water and flashlights. The composition is always very harmonic and balanced. What are you main influences, in photography and other fields that you think have influenced your way of seeing?

I work as a professional Cinematographer, and Photography is only a hobby (that I take very seriously) I usually compose the frame from my experience in filmmaking, and adapt to the situation, maybe that’s why the frames are always so balanced. I have a deep connection with animals, they’re super cute and I feel relaxed when I’m around them. So I like to take pictures of them. Every animal that I see usually takes me back to the experience I had with my dogs when I was young. 

What photographers do you most admire?  

I love Trent Parke. Everything I wanted to do, he’s already done it. In Thailand, we have a lot of great photographers that I admire too: Tavepong Pratoomwong, Akkara Naktamna, Noppadol Mitreejit. They’re great Street Photographers. 

You integrate a photography collective, o Full Frontal Flash. Why did you decide to join it? And how does it helps and influences your work?    

I joined Full Frontal Flash Collective last year. We’re a collective focused on using flash on the street. Barry Talis asked me one day if I wanted to join and I said yes straight away, because I love this collective so much. 

Are you working on any specific project right now? If yes, could you tell us about it?

I’m working on a project about my emotions. I often feel jealous of certain types of people, sometimes the feelings become strong and I think it has potential to become something nice. I just haven't figured it out yet. 

Do you make money with photography too? Or just as a cinematographer?

Just as a cinematographer. I work at Hyphen & Slash Creative Studio. It’s a production company that focuses on making commercials for television and internet. 

What equipment do you use to take your pictures?

I use Panasonic Lumix GX9 and 15mm Leica DG F1.7 Lenses.

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Bangkok sob a luz de um flash - entrevista com Tawanwad Wanavit

Tawanwad “Tang” Wanavit é um jovem diretor de fotografia publicitária tailandês, de 29 anos, conhecido na internet também por sua fotografia de rua. Nascido em Chiang Mai, uma cidade histórica do norte montanhoso da Tailândia -- antigo centro administrativo e religioso do reino de Lanna, até 1558 --, mudou-se depois para a capital, Bangkok, onde vive atualmente e onde encontra, principalmente em área periféricas, os personagens e cenários de suas imagens.

Cheias de elementos bem equilibrados, animais, luzes estouradas e humor, as fotos de Tang, segundo ele, são apenas um hobby, e não dão dinheiro. Mas já lhe renderam, em 2018, o prêmio do site APF Street Photography, com mais de 140 mil seguidores ativos, e o reconhecimento de outros importantes fotógrafos de rua na Ásia, como o também tailandês Tavepong Pratoomwong

“As fotos de Tang são como assistir a filmes blockbuster. Ele usa uma variedade de técnicas em uma foto, mas isso nunca se sobressai ao ponto focal da história que ele quer contar com suas lentes. Como resultado, as fotos de Tang são bastante impactantes e facilmente digeríveis para os espectadores”, disse Tavepong ao site BK, de fotografia, em uma entrevista sobre novas promessas da cena tailandesa de fotografia de rua.

Membro de coletivo Full Frontal Flash, Tang atualmente trabalha em um projeto sobre suas emoções. Diz que está buscando uma forma de transformar um sentimento negativo em algo positivo, através da fotografia. Mas ainda não sabe exatamente como. 

Na entrevista a seguir, o fotógrafo de rua tailandês, que teve a conta do Instagram hackeada recentemente e está começando a postar suas fotos de novo, fala ainda de sua trajetória na fotografia, da rotina criativa e de suas referências na fotografia de rua.

Quando e como começou o seu interesse por fotografia? 

Eu sempre me interessei por imagens, mas comecei a levar a fotografia a sério quando tinha por volta de 18 ou 19 anos. Foi quando tive minha primeira aula de fotografia de filme.

O que mais o atrai na fotografia?

Sou atraído pela granulação, pelas luzes intensas e pela espontaneidade na fotografia. Sempre que vejo um dos elementos, não consigo deixar de abordá-lo. Talvez seja um dos motivos pelos quais o Flashes me atrai. Sempre me dá luzes severas. 

Como você começou a fotografar?

Comecei quando viajei para o Japão com minha mãe. Éramos apenas nós dois, eu carregava minha câmera comigo para todos os lugares, e como minha mãe adora ir ao comércio, eu tive que encontrar alguma coisa para fazer. Então, comecei a tirar fotos do que estava ao meu redor.

Onde você costuma fotografar?

Eu tiro fotos principalmente em lugares que não são limpos. Ainda não descobri o motivo por trás de entrar nesses lugares, mas adoro lugares sujos nos quais há pessoas vivendo.

Como você escolhe os temas e lugares em que vai fotografar?

Eu não escolho, eu normalmente ando por aí e sinto o lugar. Trabalho instintivamente a maior parte do tempo.

Você poderia descrever sua rotina quando está fotografando?

Eu costumo dirigir até a outra parte da cidade. Fora de Bangkok geralmente há campos abertos. Sinto-me ótimo quando estou por lá. Quando alguma coisa me interessa, estaciono em qualquer lugar e desço para fotografar.

Gosto do jeito que você constrói suas fotos. Freqüentemente, algo é deformado de uma maneira engraçada, que engana quem o olha, misturando o real e o irreal. Às vezes você coloca humanos e animais no mesmo nível. Existem muitos animais, água e lanternas. A composição é sempre muito harmônica e equilibrada. Quais são suas principais influências na fotografia e em outros campos que você acha que influenciaram sua maneira de ver?

Trabalho como diretor de fotografia profissional e a fotografia é um hobby (que levo muito a sério). Geralmente componho o quadro a partir da minha experiência no cinema e me adapto à situação. Talvez seja por isso que os quadros são sempre tão equilibrados. Eu tenho uma conexão profunda com os animais, eles são super fofos e me sinto relaxado quando estou perto deles. Então eu gosto de tirar fotos deles. Todo animal que vejo geralmente me remete  à experiência que tive com meus cães quando eu era jovem.

Quais fotógrafos você mais admira?

Eu amo Trent Parke. Tudo o que eu gostaria de fazer, ele já fez. Na Tailândia, também temos muitos ótimos fotógrafos: Tavepong Pratoomwong, Akkara Naktamna, Noppadol Mitreejit. São ótimos fotógrafos de rua.

Você integra um coletivo de fotografia, o Full Frontal Flash. Por que você decidiu se juntar a ele? E como isso ajuda e influencia seu trabalho?

Entrei para o Full Frontal Flash Collective no ano passado. Somos um coletivo focado no uso de flash nas ruas. Barry Talis me perguntou um dia se eu queria participar e eu disse sim imediatamente, porque eu amo muito esse coletivo.

Você está trabalhando em algum projeto específico atualmente? Se sim, você poderia nos contar um pouco sobre ele?

Eu estou trabalhando em um projeto sobre minhas emoções. Muitas vezes sinto inveja de certos tipos de pessoas. Às vezes, esse sentimento se torna forte e acho que têm potencial para se tornar algo legal, mas ainda não descobri como.

Você ganha dinheiro com fotografia também? Ou apenas como diretor de fotografia?

Apenas como diretor de fotografia. Trabalho no Hyphen & Slash Creative Studio. É uma produtora focada em comerciais para televisão e internet.

Que câmera você usa para tirar suas fotos?

Uso uma Panasonic Lumix GX9 com uma lente Leica DG 15mm, f/1.7

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Through the Polish streets - interview with Katarzyna Kubiak

Polish photographer Katarzyna Kubiak, 35, started shooting at the age of 30, when many people already consider themselves old enough to learn anything. A civil servant in Warsaw, she started taking pictures with her cell phone on a daily bases and on trips, until she won a contest with one of them. The quality of the file generated by the device, however, prevented her from participating in the exhibition with the winners and led her to buy a better camera.

With the new equipment, she took street photography more seriously. She was part of two collectives (Streetical Collective and un-posed) and entered other contests. She has won or received honorable mentions in four of them: International Photography Awards (2015), Moscow International Photo Awards (2016), Leica Street Photo (2016) and Human DOC Proclub Camera (2016). Her photos have been published in the World Street Photography Book, Debuts (2016), Street Photography Magazine, Street Photography in the World Book vol. 1, in Eye Photo Magazine and PhotoVogue by Vogue Italy. In parallel, she has been gaining visibility on social networks - on Instagram, se has now more than 20 thousand followers.

This year, she went to Rio de Janeiro for Carnival. Despite fears about violence in the city, and warnings given by cariocas on the streets, she photographed the party.

In the following interview, Katarzyna talks about her career, the experience of taking pictures in Brazil, the difference in photography in Poland, the difficulties of balancing personal life and photography, street photography and her plans for the future as a documentary photographer.

When and how did your interest for photography started?

I started to be interested in photography at the end of 2014. I photographed everything that somehow interested me. I was taking pictures with my mobile phone at the time. By chance, I won a photo contest, but because of the very poor quality of the photo from my phone, my photo could't take part in the exhibition. I was disqualified and I was very sorry. Then I decided to buy a camera.

What attract you most in photography?

It's hard to say, but I think beauty in photography. All the time I am surprised by something in different types of photography

Why did you chose street photography?

I can't say I choose street photography because it became quite natural. It's just a form that suits me the most

What are the biggest challenge in street photography? And what do you like more about it?

Challenges in street photography are also what I like the most. I think it's a curiosity about what you can see and how you can show it. The biggest challenge, in my opinion, is to take a photo that will interest others. We are producing so many pictures now that it is very difficult to do so.

Where do you take pictures more frequently? 

I usually take pictures during my travels, mainly because I don't have time to do it every day. Working and raising my daughter takes me most of the day. Recently, mainly on weekends, I go out to take pictures in my hometown more and more often.

How do you choose the themes and places you will photograph? 

As I wrote earlier, I take pictures mainly during my travels, so these are usually the places I want to see in the country I'm visiting.

Could you please describe your routine when you are taking pictures? 

I think I treat it now more as a form of walking and taking pictures. I never have the usual routine. I just walk and take pictures of everything I find interesting.

Many scenes in your pictures are funny. What are your main influences, in photography and other fields that you think have influenced your way of seeing?

Contrary to what you've noticed, I like visually pretty pictures more than funny ones. I think it's because of my love for cinema. I think it's a big part of how I take pictures.

Could you quote other street photographer of you generation that you admire, but are not necessarily references? 

I am constantly discovering new great photographers and there's no way I can name all the people I admire here. I am also not good at remembering names, I am more familiar with other photographers after the pictures they took. 

You integrate two photography collectives. How does it helps you?  

I'm not in any collective right now, but I'm not excluding anything. Some time ago I felt that being there didn't bring anything and I decided to give up. However, I am always open to new ideas and if I decide that it is worth investing time in something and my activities I will definitely do it.  

I saw that you have been to Brazil. I guess it was for Carnival. How was your experience taking pictures here? 

Yeah, I was in Brazil this year. I really wanted to see with my own eyes what the world-famous carnival looks like. I read about the dangerous situation in Rio from the very beginning, but I didn't know what to expect. There are more and less safe countries in Europe, but that is not comparable at all. This is something completely different. In Europe I don't have to worry about the camera, I can walk with it in my hand and nothing will happen. The first time I left the hotel, people on the street came up to me and told me to hide the camera because otherwise someone would steal it. This made it very difficult for me to take pictures, because everyone was paying attention to me, most of the time probably because they were wondering how to be so stupid to walk with the camera on top. Definitely in Brazil you have to have your eyes around your head and be more careful than in Europe. Fortunately, I didn't have any unpleasant situation and I remember the carnival as a great experience. Of course, after a few days I carried my camera in my backpack, which I kept in front of me. I took out the camera, took pictures and hid it back. It was my way of taking pictures in Rio :)

How different was it from taking pictures on the streets of Poland? How people normally react to street photographers in Poland?

As I wrote earlier, it is very dangerous in Rio, but at the same time people were friendly and wonderful, very open. This makes it different from people in Poland who are rather closed and inaccessible. Surely it' s a bit of a result of our culture and history. We are less trusting and suspicious. This also results in taking pictures in Poland. Often people complain or pay attention and ask why I take pictures of them.

Are you working on any specific project right now? If yes, could you tell us about it?

Unfortunately, at the moment I am not working on any project, although I do not lack ideas. For personal reasons I have not had the time to realize it. In the near future I'm going to focus on learning new things in photography

Do you make money with photography? Or it is a hobby? If it is hobby, what is your profession?

Sometimes I make money on photography, but right now it's mostly my hobby. I am currently working as one of the managers in public administration.

What equipment do you use?

Fuji X100F

How do you see your photography today? I mean, how do you feel about your work? What would you like to explore more? What would you like to left behind?

I'm sure my approach to street photography has changed. I don't take it as seriously as I did before. It's great fun for me and I'm still passionate about it, but now I'm going to try to focus on documentary photography and as I wrote I want to learn new things.

In your portfolio, what pictures do you like more?

I think I really like multi-layered photographs, but I also pay a lot of attention to aesthetics. I like it when there is a lot going on and the frame is close. 

What would you suggest for those starting to taking pictures?

In fact, you can say that I, too, am at the beginning of this journey all the time. A few years of photographing doesn't make me an expert in this field :) However, I would like people not to pay too much attention to the opinions of others. And the other way round, let them not be jealous of the successes of others.  

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Lembranças de Serra Pelada - entrevista com Juca Martins

Lembranças de Serra Pelada - entrevista com Juca Martins

Serra Pelada foi o maior garimpo a céu aberto do mundo em seu tempo. A descoberta de ouro de aluvião por um vaqueiro no riacho da Grota Rica, como era então conhecido o lugar, atraiu rapidamente uma legião de garimpeiros de todos os cantos do país. Juca Martins foi o primeiro fotógrafo a documentar o movimento. Chegou a Serra Pelada em 1980, quando 15 mil homens trabalhavam na cava. Havia ido à Conceição do Araguaia, no Pará, para cobrir o assassinato de um líder sindical rural. Quando soube da notícia, decidiu estender a viagem.  As imagens de homens cobertos de lama, subindo e descendo escadas de madeira carregando sacos de terra, lembrando formigas, se tornariam famosas em todo o mundo. Venceu com uma o Prêmio Internacional Nikon, em 1981. Voltou depois ao garimpo, em 1986, no auge, quando 120 mil garimpeiros procuravam ouro no local, e ampliou o ensaio.

Parte do trabalho, as fotos coloridas feitas por Martins em sua segunda viagem, pode ser vista até dia 20 de agosto na Galeria Utópica. A exposição A febre do ouro é composta por 17 fotografias inéditas que mostram o trabalho intenso na cratera de 24 mil metros quadrados, aberta em meio da floresta a pouco mais de 100 quilômetros de Marabá.

Além do trabalho em Serra Pelada, Martins é conhecido pela trajetória de quase 50 anos no jornalismo brasileiro. Nascido em 1949, em Barcelos, Portugal, mudou-se com a família para São Paulo ainda menino. Começou a fotografar em 1970 e fundou, anos mais tarde, a Agência F4, ao lado de Nair Benedicto, Delfim Martins e Ricardo Malta. Primeira cooperativa de fotojornalismo brasileira, a agência ficaria conhecida, entre outras coisas, pela luta pela valorização da profissão e a defesa dos direitos de autor dos fotógrafos, a exemplo do que fez, lá fora, a lendária Magnum. Após a dissolução da F4, fundou ainda a agência Pulsar Imagens, em 1991, com Laura Del Mar e Delfim Martins. 

Ao longo da carreira, trabalhou e colaborou com jornais brasileiros e estrangeiros, e foi diretor de arte do jornal Movimento, uma das mais importantes publicações alternativas do período de ditadura militar no Brasil. Cobriu conflitos no Líbano, em El Salvador e na Guatemala; recebeu o Prêmio Esso, em 1980, o Prêmio Wladimir Herzog, em 1982, e duas vezes o Prêmio Internacional Nikon (1979 e 1981). Seu trabalho, sempre politizado, já foi exposto na Espanha, Itália, França, Alemanha, Suíça, México, Cuba, Colômbia e Equador e integra o acervo de museus aqui e lá fora. Lançou uma série de livros, entre os quais, A greve do ABC (1980), Crianças do Brasil (1981), Festas populares brasileiras (1987) e São Paulo/Capital (1998). 

Na entrevista a seguir, Martins fala sobre suas memórias de Serra Pelada, da experiência de fotografar no garimpo, do trabalho atual como editor e fotógrafo da agência online Olhar Imagem, da qual é fundador, e como coordenador do grupo de fotógrafos Fotobrasilis, no Facebook, entre outros assuntos.

Como foi a sua experiência em Serra Pelada? Você foi duas vezes, certo?

Fui. O começo, em 1980, logo no começo do garimpo. Teve toda a dificuldade de chegar no lugar. Na verdade, eu tinha ido para Conceição do Araguaia, para fazer uma matéria sobre o assassinato de um líder sindical rural. A partir de lá, já estava rolando a notícia de que havia sido descoberto um garimpo. Então, fui de ônibus. Durante a noite, viajei até Marabá. Em Marabá, tentei falar com um piloto de avião, combinar o preço. Mas tinha que ter uma autorização do Major Curió, que era o cara que controlava o garimpo, ligado ao SNI. Mandei minha credencial da Federação Nacional dos Jornalistas (FNAJ), pelo piloto. Ele levou ao garimpo, apresentou ao Curió. Eu fiquei no aeroporto de Marabá esperando e, seis horas depois, ele volta com a minha credencial dizendo: “ó, o major Curió autorizou a sua ida”. Ai eu fui. Desci no aeroporto, como todo mundo. Fui revistado, como todo mundo que chegava tanto de avião quando por trilhas cruzando a floresta. Passei dois dias fotografando. Voltei, seis anos depois, em 1986, já no final do garimpo. Já era uma situação completamente diferente. Não era mais o Serviço Nacional de Informações (SNI) que controlava. Era a associação de garimpeiros de Serra Pelada que fazia o controle. Era preciso ter carteirinha para poder garimpar. Já tinha interferência de gente ligada ao Ministérios de Minas e Energia, de controle de solo. Era outra estrutura. E já tinha uma mini cidade, com mercadinho e outras coisas, tudo de madeira, parecendo velho oeste. Foram dois períodos, nesse espaço de seis ano. Dois dias na primeira viagem e dois dias, na segunda. 

Você fotografava o tempo todo?

O tempo inteiro. É uma coisa tão rica. Onde você olha, tem foto para fazer. Não dá pra perder clique.

Na exposição, você privilegiou as fotos do garimpo, mesmo. Do pessoal extraindo ouro. Mas você tem fotos do entorno?

Não, eu priorizei. O que interessava, mesmo, era o garimpo. Na primeira vez que fui, não tinha uma vida fora do garimpo. Os garimpeiros viviam em barracas praticamente do lado de onde eles estavam cavando. Na segunda, você já tinha uma cidadezinha, uma rua principal. A Associação de garimpeiros já era uma casa em madeira. O hotel onde eu fiquei hospedado já tinha dois andares, em madeira, com música ambiente, com bar. Mas disso eu tenho um clique ou outro. O meu interesse era a cava, a notícia estava lá. Talvez se eu tivesse mais de dois dias, talvez fosse o caso. Se você pegar uma semana, duas semanas, seria o ideal. Porque ai você pode acompanhar o cara lá dentro e ir com ele na hora que ele se lava e vai pra casa dele. Mas ai precisaria investir mais para fazer.

E você descia aquelas escadas todas?

Descia. Mas até lá no fundo eu nunca desci. Ia até o meio do caminho, ou por um caminho mais fácil, e descia. Porque o risco de ir lá embaixo, de escorregar, de haver um desmoronamento, também era frequente. Eu nunca corri riscos, não só nessa matéria. Em outras também. Sempre achei que a foto não vale a vida. Eu valorizo a vida, a obra vale menos que a vida. Não vou me arriscar para ter uma foto e dizerem "pô, o cara é um gênio da fotografia". Não, eu não. Eu vou fazer fotografia legal, e tal, mas…

Esses garimpos são frequentemente associados à ambientes sem lei, caóticos. Havia algum tipo de dificuldade para fotografar? O que você sentia?

Não, já tinha lei. O major Curió tinha controle absoluto. Você não entrava assim. Era revistado ao entrar no garimpo, para não carregar armamento. Armas eram proibidas. E você era revistado ao sair do garimpo, para evitar contrabando de ouro. Era um controle absoluto. O ouro era vendido em Serra Pelada em uma agência da Caixa Econômica Federal. Essa é uma impressão equivocada. Mesmo depois, em 1986, quando já era a associação dos garimpeiro, também havia controle. Você não entrava lá sem a carteirinha da associação. Se o cara fizesse alguma coisa errada, perdia a carteira e não conseguia mais trabalhar no garimpo. Recentemente, vi trechos de um vídeo sobre Serra Pelada, do Heitor Dhalia. Tem cenas em que o cara grita "bamborra! bamborra!", que é o que gritam quando acham uma pepita grande. Ai o cara arranca o revólver da cintura e atira para o alto. Pô, mentira. Nunca. Nunca vi pessoa com arma lá, nem dar tiro no garimpo. Aquilo é um efeito cinematográfico, não era real. No garimpo não aconteceu isso. Não tem nenhuma historia de tiro, de assassinato no garimpo de Serra Pelada, na história de seis, sete anos. O que aconteceu de violência e acidentes foi desmoronamento, falta de cuidados, por não drenar a água, morro que soterrou gente. Mas não tinha essa violência de revolver e tiro, diferente do outros garimpos. Isso parece que acontece em outros garimpos.

Você cita no texto da exposição uma história maravilhosa, do Índio, que torra uma fortuna em ouro em três anos. Como você o conheceu?

Eu não conheci. É uma citação. É uma história que está no YouTube. Quando eu fui em 1986, era uma referência. A história desse Índio circulava lá. Eu, pessoalmente, nunca conheci o cara. Nunca falei com ele. Mas ele se tornou um mito, uma história do folclore do garimpo.

Quais os teus projetos hoje?

Atualmente, eu cuido da Olhar Imagem, uma agência online de venda de fotos, licenciamento para revistas e livros escolares. Mais para mídia impressa. A agência não é só minha. Tenho um grupo de fotógrafos que trabalham comigo. Eu coordeno uma página no Facebook, chamada FotoBrasilis, onde eu fotografo, mais um grupo de 20, 20 e poucos fotógrafos também, e publicam lá. A partir dessas fotos publicadas nessa página, eu edito. Se é muito boa, manda para o arquivo. Eu escolho as fotos que eu peço em alta. o Foto Brasilis hoje é um grupo que faz ainda muita coisa na rua. Eu ainda vou para a rua. Fotografo menos. Mas estive na Marcha da Maconha. Essas manifestações que teve, dos estudantes, eu fui para a Paulista. A segunda eu fui também. Na terceira, no dia 14, a Greve Geral, eu fui para a Av. Paulista fotografar. Sempre que posso, ainda estou indo à rua. Menos do que naquela época. Não consigo mais. Antigamente, a gente viajava com duas câmeras fotográficas, uma P&B, outra cor, com cinco lentes. Hoje, pô, eu saio com uma Canonzinha pequenininha, só, no bolso. Quando eu vou com mochila e equipamento mais pesado, incomoda, cansa. Então, eu continuo produzindo foto documental. Meu negócio continua sendo fotojornalismo. Isso eu continuo fazendo. 

Que equipamentos você tem usado?

Eu tenho as Nikons, uma D-7000, tinha uma D-800, com lentes que vão de 16mm até 500mm. Mas eu ando muito com uma canonzinha G-7 Mark II, pequeneninha, que cabe no bolso de uma camisa, faz um arquivo grande, de 20 megas, e tem uma lente que vai de 24mm a 100mm. Se for pensar, o meu trabalho todo é coberto de uma 28mm a uma 100mm. A 24mm é 1.8. E a 100mm dela é 2.8. Aguenta um ISO alto. Então, hoje em dia, está me resolvendo para fazer a fotografia que eu gosto. Tem ainda a vantagem de não chamar a atenção de ladrão. De repente, o cara olha e pensa, “isso ai não vale porra nenhuma, é máquina de amador. Deixa o cara sossegado”. Outro aspeto são os seguranças nos lugares, nos shoppings, em lojas. Se você tirar uma Nikon, o cara vai dizer que não pode. Com a maquininha, as vezes o cara chega, eu digo que sou turista, que estou conhecendo a cidade de São Paulo. Então, isso facilitou demais. Vou usando equipamentos pequenos, mas fazendo coisas nesse estilo que você viu.

Que temas te interessam mais hoje?

Os temas sociais. A questão do menor, eu acompanho e tenho um trabalho grande. Menores abandonados em cidades, menores marginais nas cidades, menores trabalhando em canaviais e outras coisas pesadas, menores trabalhando na Amazônia. Na minha parte P&B de Serra Pelada, que é mais forte que essa colorida, tem crianças e trabalho. A questão de habitação, transporte, segurança e trabalho, são os grandes temas. O meu olho vai estar sempre voltado para isso. A educação, a criança e a educação. Habitação. Como essas pessoas estão vivendo. O trabalho, transporte e saúde. Praticamente, esses cinco itens, me ocuparam quando eu comecei no jornalismo há 50 anos atrás, praticamente, e continuam sendo de meu interesse até hoje.

Você acompanha novos fotógrafos? Tem algum trabalho que te chamou a atenção recentemente?

Mais ou menos. O trabalho do Mauricio Lima, prêmio Pulitzer, é impressionante. Tem alguns caras novos. Posso até errar o nome. Felipe Dana, é um cara novo. Tem um cara novo, no Foto Brasilis, chamado Levi Bianco. O Vitor Drago. São uns caras que, para onde eles apontam a câmera, vêm coisas que surpreendem. Acho que é ai que você vê quando o cara é bom fotógrafo, que tem talento. Desses que eu citei, o Mauricio Lima é o mais velho. Mas os outros são bem novos.

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Arte na fotografia - entrevista com Claudio Edinger

Nascido no Rio de Janeiro, em 1952, Claudio Edinger é dono de uma estética difícil de confundir. Suas imagens, já há muitos anos, trazem poucos elementos em foco. O restante permanece sem nitidez, como em tilt-shift. Muitas das imagens feitas assim são retratos, paisagens urbanas ou fotos aéreas de cidades como o Rio de Janeiro, São Paulo, Paris e Nova York, ou de regiões como a Toscana. Mudam a perspectiva de quem vê, apresentam um mundo em que grandes prédios, muitas vezes, parecem miniaturas.  

Em sua longa e prolífica trajetória na fotografia, Edinger publicou fotos em mais de 56 veículos, no Brasil e no exterior, entre os quais Business Week, Conde Nast’s Traveler, Marie Claire, Elle, National Geographic, New York Times Magazine, Paris Match, Valor, Veja e The Washington Post. Prêmios e bolsas, foram ao menos 14. Exposições, foram mais de 80, desde 1975. Livros publicados, são quase 20, entre os quais os dedicados ao lendário Hotel Chelsea; a praia de Venice, na Califórnia; o Carnaval brasileiro e a loucura.  

Este ano, já lançou um livro e uma exposição. O livro, História da fotografia autoral e a pintura moderna, é resultado de uma pesquisa de cerca de dez anos. A exposição é mais uma etapa do projeto Machina Mundi, de fotos aéreas feitas em diversos países.

Na entrevista a seguir, Edinger fala sobre as origens do novo livro, as diferenças de  formação e perfil dos fotógrafos brasileiros e americanos (Edinger morou 20 anos nos EUA), os projetos que têm em andamento, seu processo criativo e sua visão sobre o futuro da fotografia, em um momento em que a popularização dos telefones celulares torna a prática acessível a um número inédito e crescente de pessoas no mundo.

O que o levou a escrever "História da fotografia autoral e a pintura moderna"? Que papel espera que a obra tenha para os fotógrafos e a fotografia brasileira?

Tenho dado cursos de fotografia há 40 anos. Quando voltei para o Brasil, depois de 20 anos fora (nos Estados Unidos), notei que temos muito talento, mas pouca cultura fotográfica. Sem cultura é impossível ser um bom fotógrafo autoral. Aí comecei a pesquisar de onde vinha o meu conhecimento. Uma coisa foi puxando a outra e quando percebi tinha material suficiente para um livro. Espero que este livro sirva de impulso para os jovens artistas brasileiros. O livro não tem nenhuma pretensão. O que temos que saber é muito, e este livro é só um balde do oceano. Mas é um bom começo, espero, para fotógrafos e para o público em geral perceber (quem ainda não notou) a imensa dimensão de nossa arte, em todas as direções.

Como avalia a formação dos fotógrafos brasileiros em história da arte? E de que forma isso impacta a qualidade da fotografia brasileira?

Tenho visto que quando menciono alguns nomes nos workshops ninguém conhece. Daí concluí que nossa cultura é deficiente. Como é deficiente nossa educação. Mas temos uma criatividade absurda, o que é muito bom. Com um pouco de educação, iremos a lugares pouco explorados. É só reparar a nossa riqueza musical. Rítmos e estilos variados — esta é a nossa natureza, somos uma mistura de raças que vai dar muito certo, principalmente no que diz respeito à arte, à economia criativa. Só é preciso um pouco de investimento nisso.

Você viveu duas décadas nos Estados Unidos. De modo geral, quais as diferenças fundamentais (de formação e estilo) entre os fotógrafos de lá e daqui?

A América viveu um boom econômico absurdo no pós guerra. Investiram pesado na educação, têm possivelmente as melhores universidades do planeta, sempre acreditaram na importância da educação. A coisa funciona como uma bola de neve. Bons alunos viram bons professores que pedem por grandes museus que acabam sendo apoiados pela sociedade e tudo reverte para uma melhor educação. Mas nós temos um poder criativo incomparável. Se nos derem as mínimas condições vamos transformar nosso país em uma potência. Já estamos a caminho. Vejo isso como um movimento irreversível. 

Além de lançar o livro, este ano você já inaugurou a exposição Machina Mundi NYC. Quais os próximos projetos em vista e ou já em andamento?

A vantagem de se fazer as coisas no Brasil é que temos sempre que ter cinco ou seis projetos em andamento ao mesmo tempo para poder, enfim, viabilizar um deles. Estou fazendo um livro com fotos aéreas, Machina Mundi 2, um livro de histórias dos meus projetos (“Coisas que eu vi”). Ando pesquisando a criação de uma universidade de arte e tecnologia, quero fazer um livro sobre Jerusalém, outro sobre a China. Quem fica parado é poste.

Nos últimos anos, com as câmeras digitais, a fotografia se popularizou. Hoje, todo mundo se acha um pouco fotógrafo. É possível comprar fotos em grandes bancos de imagens a por centavos. Por outro lado, o preço dos equipamentos de qualidade ainda é muito alto. Qual a sua visão sobre o futuro da fotografia? Haverá espaço para que tipo de profissional?

Sempre haverá espaço para os profissionais — de moda, publicidade, jornalismo, gastronomia, arquitetura e casamento. Mas a fotografia autoral, que é a que me interessa, é a que mais tem evoluído. As redes sociais são de extrema valia. Poder publicar o que fazemos ajuda-nos a  avaliar nosso trabalho, a corrigir os erros, a aprofundar a pesquisa. A fotografia se transformou na pintura do século 21. As obras sendo produzidas, e também os altíssimos preços, na casa dos milhões de dólares, de algumas delas, têm demonstrado isso. 

Hoje, quase todo mundo fotografa com celular. As câmeras dos smartphones são cada vez melhores. Mesmo fotógrafos profissionais, cada vez mais, utilizam o celular, até pela praticidade. Mas praticamente todos os aparelhos tem um mesmo tipo de lente, as 28mm. Essa homogeneização impacta de alguma forma a estética fotográfica do nosso tempo? Se sim, de que forma? Há paralelos como outros períodos da história, como quando surgiram as câmeras 35mm, por exemplo?

Vivemos uma época sem precedentes na história. Principalmente na história da fotografia. Os smartphones têm revolucionado nosso olhar. A câmera agora é onipresente. Todo mundo está sendo alfabetizado, por assim dizer, em imagens fotográficas. É um revolução cultural comparável (mas muito superior) ao do aparecimento da escrita — as épocas são absolutamente diferentes. Não acredito em homogeneização da imagem, pelo menos nas imagens que importam. O photoshop e os aplicativos abrem absurdas possibilidades. O que fotografamos hoje é só uma linha — a pipa está lá em cima…

Como é hoje seu processo de criação? Como define os temas que vai fotografar?

Eu acredito que a fotografia é uma força da Natureza e comigo tem sido sempre assim. As situações vão aparecendo, a fotografia vai puxando a gente. Este trabalho com imagens aéreas, por exemplo, aconteceu por acaso porque me pediram uma foto do Maracanã. Acabei fotografando o Rio e assim começou. 

Que novos fotógrafos ou correntes fotográficas hoje chamam a sua atenção no Brasil e no mundo?

No Brasil temos uma lista gigante de talentos antigos e novos e não vou citar nomes para não esquecer de ninguém. Mas em meu livro você tem os fotógrafos que pra mim são relevantes hoje em dia. Quanto às correntes fotográficas, são muitas, em todas as direções, desde auto-retratos incríveis, até stills de cinema, até construções surreais. A fotografia cresce horizontalmente e, a cada dia, aparecem talentos e obras novas. É lindo de se ver.

Como avalia a fotografia brasileira hoje? Por quê?

Nossa fotografia está entre as cinco mais importantes do mundo e com um pouco de ajuda vai pro topo. Somos uma jovem nação com um talento atávico extraordinário. Vivemos um momento fantástico, ainda mais diante de todas as dificuldades que enfrentamos. Ou talvez exatamente por isso.

Que equipamentos tem usado atualmente?

Uso uma Canon 5D Mark IV e um drone Mavic Pro 2 com câmera Hasselblad.

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Brasil Indígena - entrevista com Rodrigo Paiva

Esta entrevista está no forno há uns três anos. Na época, Rodrigo Paiva, amigo fotojornalista tocava um projeto fotográfico e um documentário sobre povos indígenas brasileiros. Tinha coberto uma edição dos Jogos dos Povos Indígenas, em 2013, e uma dos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, espécie de Olimpíada dos povos indígenas, em 2015. Havia viajado e feito entrevistas sobre os conflitos entre indígenas e fazendeiros no Centro-Oeste. O material em vídeo não chegou a ficar pronto. Mas, dos jogos, saiu uma série de retratos, a que deu o nome de Brasil Indígena. Vi as imagens e achei que seria legal falar sobre elas por aqui.

Sentamos para conversar numa sexta-feira, no Mercado Municipal de Pinheiros, em São Paulo. Pedimos arroz com polvo e algumas cervejas, no Rainha do Mercado. Antes que editasse a entrevista, fui convidado a trabalhar em tempo integral em uma redação. O tempo livre rareou e acabei deixando o blog e o papo parados até agora.

Da data da conversa para cá, Rodrigo migrou do fotojornalismo, cada vez mais mal remunerado, para a fotografia de publicidade. E o projeto de fotografar etnias indígenas, batizado de Brasil Indígena, ficou em banho-maria. Mas como as fotos continuam a me chamar a atenção, e a questão indígena ganhou ainda mais relevância no atual cenário político brasileiro, resolvi publicá-las, com a entrevista, mesmo depois de todo esse tempo. É a que segue.

Como surgiu a ideia de fazer o teu projeto Brasil Indígena?

Sempre fui apaixonado pelas histórias dos índios. Na minha infância, eu e minha mãe passávamos os domingos assistindo as incursões do Washington Novaes no Xingu. Em 2012, tive a ideia de ir para o Mato Grosso do Sul tentar fotografar o movimento de retomada (do que os índios reclamam como suas terras sagradas), o Tekoha. Fui sozinho. Um certo dia, uns amigos que sabiam do meu interesse pelos índios, me falaram da organização dos jogos indígenas, no Mato Grosso. Comecei a pensar no que fazer para as minhas fotos se destacarem. Eu sabia que as agências internacionais iam estar lá. Ia fazer foto de jogos? Por quê? Aí veio a ideia de fazer um retrato de cada time, de contar a história das etnias do Brasil. Afinal, iam estar lá 48 etnias.

A ideia foi fazer um registro etnográfico, então?

Minha referência eram aquelas gravuras antigas de índios. Desde o momento que eu cheguei lá, meu foco foi fazer retratos. E não é fácil fazer retrato deles. Porque os organizadores ficam muito tensos, não deixam. Tem toda preocupação com a imagem do índio. Eu não tinha visto, até então, quem tivesse feito isso, que tivesse esse acervo. Geralmente o cara tem de um canto do país. Do Pará ou da Amazônia. Achei que era uma ótima oportunidade de fazer.

E você voltou nos jogos de 2015. Como foi fotografar nessa segunda vez? Foi mais fácil ou mais difícil?

Foi muito mais difícil. Me pareceu que o governo federal tinha o controle absoluto do que estava acontecendo. Da outra vez, em 2013, me pareceu mais amador. As próprias filhas do Carlos Terena, que é o grande organizador dessa história, estavam fazendo assessoria junto com outras meninas. Os índios ficavam com a gente, tinha uma interação muito legal. Os mais isolados nos olhavam muito, se olhavam entre si. Foi mais interativo. Eles estavam muito melhor, parecia que estavam mais felizes. Já em 2015, parece que profissionalizaram o negócio. O governo teve a preocupação de não deixar os indígenas próximos da arena onde aconteciam os jogos. Eles se movimentavam de ônibus, a gente tinha pouco contato com eles. Sem dúvida o governo estava muito mais preocupado. Coincidência ou não, na mesma semana estava rolando a discussão sobre a PEC 215. Tinha muita polícia por lá, tropa de choque. Acho que não haverá outros jogos como os de 2013. Parecia ser mais orgânico, as pessoas interagiam. Dessa vez, não era orgânico. Mesmo porque, o evento foi aberto pela presidente Dilma com a Kátia Abreu (empresária pecuarista, então ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), que os índios dizem ser a principal inimiga deles.

Você expôs as fotos que já tinha do projeto lá, né? Como foi a recepção?

Eu não tive contato, cheguei no domingo. Tinha fotos de outros fotógrafos também. Eu não sei te falar. Não consegui conversar com os índios.

Quantas etnias você já tem fotografadas? O que você imagina fazer com esse material?

Tenho 17 etnias bem retratadas, de um jeito que eu gostei. Estão bem resolvidas. Eu ainda não sei o que eu quero fazer com esse material. Minha intenção é continuar a tocar, ir juntando. Seria legal expor, mostrar, se fosse pro exterior. Mostrar esse gene nosso. Porque a gente é muito índio. O interessante do índio é que cada etnia é diferente. Eles têm os traços diferentes, os cabelos diferentes, a estrutura corporal diferente. Os olhos são diferentes, a sobrancelha. São totalmente diferentes. Você vai para São Luís, é um tipo. Você vai pro Sul do país, é outro.

Você tem um material em vídeo também, né?

É, mas é da Retomada.

Pretende dar continuidade a ele também?

Não, a Retomada é diferente do Brasil Indígena. É sobre o maior conflito indígena por terras do país. Tem um dos meus personagens, um político, que diz que você pode voltar daqui a 30 anos, e tudo vai continuar na mesma, porque ninguém resolve nada. Eu tenho duas incursões grandes no Mato Grosso do Sul. É um registro histórico. No futuro, tudo isso vai se encontrar. Daqui a 30 anos, as pessoas vão olhar essas imagens e vão falar, que coisa de louco. Tenho certeza de que daqui a 30 anos, a metade das etnias que eu fotografei já vão estar diluídas nesse processo. São por volta de 362 no país, eu só tenho 17. Eu não conto que vou ganhar dinheiro com isso. Eu quero que fique como registro. Um dia esse material vai servir para estudos. Eu piro nisso.

Como e quando você começou na fotografia?

No interior (Assis - SP) não tinha essa influência de fotografia. Muito menos eu, que venho de uma família de funcionários públicos. Só tinha aquelas shotzinha, com filme. Mas meus pais assinavam a Folha de S.Paulo. Eu ficava impressionado com aquelas fotos, aqueles títulos, aquelas reportagens. Uma vez eu vi uma foto muito louca, do Jorge Araújo, lá em Brasília. Um cavalo empinado, pau quebrando, com índio. Pensei, é isso que eu quero fazer da minha vida. Tinha uns 14 anos. Aí fui fazer publicidade. Certo dia, um professor de antropologia chamado Rubens falou: vamos fazer, cada um, aqui em Assis, um documentário fotográfico. Aquele chamado me despertou. Fui nas Casas Bahia e comprei uma Zenit. Custava R$ 135. Tinha uma objetiva grande angular. Tinha uns meninos que nadavam no esgoto, em Assis. Eu fiz uma história que chamava Meninos do Esgoto. Teve repercussão na cidade, exposição e tudo. Daí não parei mais.

Fez publicidade?

Mudei para Piracicaba. Fiz jornalismo, durante dois anos, depois fui para publicidade. Mas continuei na fotografia. Em 1998, vim pra São Paulo, fazer estágio. Foi onde eu comecei a ver as primeiras referências legais de composição. Eu tinha me dado bem como diretor de arte, ganhado um prêmio na faculdade. Mas minha vida era fotografia. E eu não tinha dinheiro para isso. Aí fui pro Canadá para comprar uma câmera razoável.

E comprou que câmera?

Cheguei lá sem dinheiro, no início dos anos 2000, e comprei uma Olympus. Ai voltei pro Brasil e fui direto para a pós-graduação no Senac, em 2002. Quando eu entrei, um amigo meu disse que tinha uma vaga lá na Futura Press e que eu tinha estilo de fotojornalista. Bem depois fui trabalhar na Folha. Conheci o João Bittar e ele falou pra eu ir na Agência Estado conversar com a Mônica Maia, que me deu uma puta oportunidade. Até que o João Bittar me chamou para fazer uns trabalhos na Quem e na Revista Época. Cobri uns oito meses de Mensalão em Brasília. Acabando isso, voltei pra São Paulo, acho que foi em 2005. O João Bittar me indicou para a Folha, para o Toni Pires. O Toni me contratou como freela fixo. Fiquei até 2008 lá. Foi a grande escola, mesmo. Você recebe três pautas por dia, todo santo dia. Trabalhava 14 dias e folgava dois. Foram três anos assim. Chegou um momento em que eu não aguentava mais. Resolvi ir embora pra Austrália, dar uma respirada. Depois de oito meses trabalhando em cozinha, falei vamos embora dessa porra, voltar pro Brasil que eu preciso voltar a fotografar. Fotografia é igual a futebol. Se para de treinar, a bola bate na canela. Voltei e, de cara, tive uma oportunidade na Reuters. Mas eu não estava preparado. Fazia já quase uma ano que não fotografava. Aí voltei pra vida de freela.

Quem são as tuas principais referências em fotografia?

Eu não tenho umas referências certas assim. Sendo profissional, você tem que estudar história da fotografia, tem que parar e olhar para todos os profissionais que estão se destacando. Cada um tem uma visão diferente. E você vai pegando. Eu boto no search da Reuters e vejo todas as fotografias que estão ali. Entro na Agência Estado e vejo todas as fotografias que estão ali. Marcar uma estética sua é difícil. Você vai pegando referências de um e outro, testando, adaptando ao seu trabalho. Precisa estudar todo santo dia. Olho pra tudo. Sou xereta. Quero ver mais sobre a pessoa, se me chama a atenção. Tento usar fotojornalismo misturado com direção de arte. Eu sempre trabalho com as regras de direção de arte. Em uma foto, os elementos precisam estar distribuídos harmonicamente. Me preocupo com aspectos formais de composição. Peso e equilíbrio. O básico é o fotojornalismo. Mas eu tento agregar esse lado de direção de arte, para melhorar a estética. Vem junto essas referências. Não existe segredo. Tudo é referência. É uma somatória de repertórios. Você precisa estudar a todo momento.


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