Pelas ruas polonesas - entrevista com Katarzyna Kubiak
A fotógrafa polonesa Katarzyna Kubiak, de 35 anos, iniciou na fotografar aos 30 anos, idade em que muita gente já se considera velha para aprender qualquer coisa. Funcionária pública em Varsóvia, começou tirando fotos com o celular no dia a dia e em viagens, até vencer com uma delas um concurso. A qualidade do arquivo gerada pelo aparelho, porém, impediu que participasse da exposição com os vencedores e a levou a comprar uma câmera melhor.
Com o equipamento novo, passou a levar a fotografia de rua mais a sério. Fez parte de dois coletivos (Streetical Collective e un-posed) e se inscreveu em outros concursos. Venceu ou recebeu menções honrosas em quatro: International Photography Awards (2015), Moscow International Photo Awards (2016), Leica Street Photo (2016) e Human DOC Proclub Camera (2016). Teve fotos publicadas no World Street Photography Book, no Debuts (2016), na Street Photography Magazine, no Street Photography in the World Book vol. 1, na Eye Photo Magazine e na PhotoVogue, da Vogue italiana. Em paralelo, aos poucos, foi ganhando visibilidade nas redes sociais - hoje, no Instagram, tem mais de 20 mil seguidores.
Este ano, esteve no Rio de Janeiro, para o Carnaval. Apesar do receio em relação à violência na cidade, e dos alertas dados por cariocas na rua já por aqui, fotografou a festa.
Na entrevista a seguir, Katarzyna fala sobre sua trajetória, a experiência de fotografar no Brasil, a diferença de fotografar na Polônia, as dificuldades de conciliar a vida pessoal com a fotografia, a fotografia de rua e seus planos para o futuro como fotógrafa documental.
Quando você começou a seu interesse pela fotografia?
Comecei a me interessar por fotografia no final de 2014. Fotografava tudo que de alguma forma me interessava. Na época, eu tirava fotos com meu telefone celular. Por acaso, venci um concurso de fotografia, mas por causa da baixa qualidade da foto do meu celular, minha foto não pode fazer parte da exposição. Fui desclassificada e lamentei muito. Então, decidi comprar uma câmera.
O que mais atrai você na fotografia?
É difícil dizer, mas acho que é a beleza na fotografia. O tempo todo me surpreendo com algo em diferentes tipos de fotografia.
Por que você escolheu a fotografia de rua?
Eu não posso dizer que escolhi a fotografia de rua porque foi um processo natural. É apenas a forma que funciona melhor para mim.
Quais os maiores desafios na fotografia de rua? E o que você mais gosta?
Os desafios na fotografia de rua são o que eu mais gosto. Eu acho que é uma curiosidade em relação ao que você pode ver e como vai mostrar isso. O maior desafio é tirar uma foto que vai interessar outras pessoas. Produzimos tantas fotos hoje em dia que é muito difícil fazer isso.
Onde você costuma fotografar com mais frequência?
Eu normalmente tiro fotos durante minhas viagens, principalmente porque eu não tenho tempo para fazer isso todos os dias. Trabalhar e cuidar da minha filha toma a maior parte do meu dia. Recentemente, principalmente nos finais de semana, e com cada vez mais frequência, saio para tirar fotos em minha cidade natal.
Como você escolhe os temas que vai fotografar?
Eu tiro a fotos principalmente em minhas viagens. Então esses são normalmente os lugares que eu quero ver no país que estou visitando.
Você poderia descrever sua rotina quando está fotografando?
Eu acho que trato isso agora mais como uma forma de caminhar e tirar fotos. Eu nunca sigo uma rotina. Eu simplesmente ando e tiro fotos de tudo que acho interessante.
Muitas cenas em suas fotos são engraçadas. Quais são suas principais influências, em fotografia e em outras áreas que você acha que influenciam a sua forma de ver?
Ao contrário do que você notou, eu gosto mais de fotos visualmente bonitas do que das engraçadas. Acho que é por causa do meu amor pelo cinema. Acho que explica muito sobre como eu fotografo.
Poderia citar outros fotógrafos de rua de sua geração que você admira, mas que não necessariamente referências para você?
Eu constantemente descubro novos excelentes fotógrafos e não seria possível eu nomear todas as pessoas que eu admiro aqui. Eu também não sou boa em lembrar nomes, eu tenho mais facilidade de identificá-los pelas fotos que tiram.
Você integra dois coletivos de fotografia. Como isso ajuda você?
Eu não estou em nenhum coletivo no momento, mas não estou excluindo a possibilidade. Há algum tempo atrás, eu senti que fazer parte dos coletivos não me trazia nada e decidi sair. No entanto, estou sempre aberta para novas ideias e, se decidir que vale a pena investir tempo em algo, ou em minhas atividades, certamente foi fazê-lo.
Eu vi que você esteve no Brasil. Acho que foi no Carnaval. Como foi sua experiência fotografando aqui?
Sim, eu estive no Brasil este ano. Eu queria realmente ver com os meus próprios olhos como o mundialmente famoso Carnaval se parece. Eu li sobre a situação perigosa no Rio de Janeiro desde o começo, mas eu não sabia o que esperar. Há países mais e menos seguros na Europa, mas não há comparação, de forma alguma. É algo completamente diferente. Na Europa, eu não preciso me preocupar com a câmera, posso andar com ela na mão e nada vai acontecer. A primeira vez que eu saí do hotel, as pessoas na rua vieram até mim e me disseram para esconder a câmera, porque de outra forma alguém iria roubá-la. Isso dificultou muito para mim tirar fotos, porque todos estavam prestando atenção em mim. A maior parte do tempo, provavelmente, imaginando como alguém poderia ser tão estúpido de andar com uma câmera à mostra. No Brasil, definitivamente você tem que ter os olhos na nuca e ter mais cuidado do que na Europa. Felizmente, não passei por nenhuma situação desagradável e lembro do Carnaval como uma excelente experiência. Claro, depois de alguns dias carregando minha câmera na mochila, que eu levo à minha frente. Eu tirava a câmera, fazia as fotos e escondia de volta. Foi o meu jeito de fotografar no Rio.
Quão diferente foi de tirar fotos nas ruas da Polônia? Como as as pessoas normalmente reagem a fotógrafos de rua na Polônia?
Como eu escrevi, o Rio é muito perigoso. Mas, ao mesmo tempo, as pessoas era amigáveis e maravilhosas, muito abertas. Isso as torna diferentes das pessoas na Polônia, que são bastante fechadas e inacessíveis. Certamente, é algo que reflete nossa cultura e história. Somos mais desconfiados. E isso também tem efeito quando se tira fotos na Polônia. Frequentemente, as pessoas reclamam, prestam atenção e perguntam porque estou tirando fotos delas.
Você está trabalhando em algum projeto atualmente?
Infelizmente, no momento não estou trabalhando em nenhum projeto, embora não me faltem ideias. Por razões pessoais, eu não tenho tido tempo para realizá-las. Em um futuro próximo, eu vou me focar em aprender coisas novas em fotografia.
Que equipamento você usa?
Eu uso uma Fuji X100F
Como você vê a sua fotografia hoje? Como você se sente em relação ao seu trabalho? O que você gostaria de explorar mais? O que você pretende deixar para trás?
Eu tenho certeza de que minha abordagem na fotografia de rua mudou. Eu não levo mais tão a sério como levava antes. Ainda me divirto muito com e sou apaixonada pela prática, mas agora vou tentar me focar em fotografia documental e, como escrevi antes, quero aprender coisas novas.
Que fotografias do seu portfólio você gosta mais?
Eu acho que realmente gosto de fotografias com multiplos planos, mas eu também presto muita atenção à estética. Eu gosto quando há várias coisas acontecendo e o enquadramento está próximo.
O que você sugeriria para quem está começando a tirar fotos?
De fato, você pode dizer que eu também estou no começo dessa jornada o tempo todo. Alguns anos de fotografia não me tornam uma especialista nessa áreas. No entanto, eu gostaria que as pessoas não prestassem tanta atenção às opiniões do outros. E, por outro lado, não tivessem ciúmes do sucesso dos outros.
Through the Polish streets - interview with Katarzyna Kubiak
Polish photographer Katarzyna Kubiak, 35, started shooting at the age of 30, when many people already consider themselves old enough to learn anything. A civil servant in Warsaw, she started taking pictures with her cell phone on a daily bases and on trips, until she won a contest with one of them. The quality of the file generated by the device, however, prevented her from participating in the exhibition with the winners and led her to buy a better camera.
With the new equipment, she took street photography more seriously. She was part of two collectives (Streetical Collective and un-posed) and entered other contests. She has won or received honorable mentions in four of them: International Photography Awards (2015), Moscow International Photo Awards (2016), Leica Street Photo (2016) and Human DOC Proclub Camera (2016). Her photos have been published in the World Street Photography Book, Debuts (2016), Street Photography Magazine, Street Photography in the World Book vol. 1, in Eye Photo Magazine and PhotoVogue by Vogue Italy. In parallel, she has been gaining visibility on social networks - on Instagram, se has now more than 20 thousand followers.
This year, she went to Rio de Janeiro for Carnival. Despite fears about violence in the city, and warnings given by cariocas on the streets, she photographed the party.
In the following interview, Katarzyna talks about her career, the experience of taking pictures in Brazil, the difference in photography in Poland, the difficulties of balancing personal life and photography, street photography and her plans for the future as a documentary photographer.
When and how did your interest for photography started?
I started to be interested in photography at the end of 2014. I photographed everything that somehow interested me. I was taking pictures with my mobile phone at the time. By chance, I won a photo contest, but because of the very poor quality of the photo from my phone, my photo could't take part in the exhibition. I was disqualified and I was very sorry. Then I decided to buy a camera.
What attract you most in photography?
It's hard to say, but I think beauty in photography. All the time I am surprised by something in different types of photography
Why did you chose street photography?
I can't say I choose street photography because it became quite natural. It's just a form that suits me the most
What are the biggest challenge in street photography? And what do you like more about it?
Challenges in street photography are also what I like the most. I think it's a curiosity about what you can see and how you can show it. The biggest challenge, in my opinion, is to take a photo that will interest others. We are producing so many pictures now that it is very difficult to do so.
Where do you take pictures more frequently?
I usually take pictures during my travels, mainly because I don't have time to do it every day. Working and raising my daughter takes me most of the day. Recently, mainly on weekends, I go out to take pictures in my hometown more and more often.
How do you choose the themes and places you will photograph?
As I wrote earlier, I take pictures mainly during my travels, so these are usually the places I want to see in the country I'm visiting.
Could you please describe your routine when you are taking pictures?
I think I treat it now more as a form of walking and taking pictures. I never have the usual routine. I just walk and take pictures of everything I find interesting.
Many scenes in your pictures are funny. What are your main influences, in photography and other fields that you think have influenced your way of seeing?
Contrary to what you've noticed, I like visually pretty pictures more than funny ones. I think it's because of my love for cinema. I think it's a big part of how I take pictures.
Could you quote other street photographer of you generation that you admire, but are not necessarily references?
I am constantly discovering new great photographers and there's no way I can name all the people I admire here. I am also not good at remembering names, I am more familiar with other photographers after the pictures they took.
You integrate two photography collectives. How does it helps you?
I'm not in any collective right now, but I'm not excluding anything. Some time ago I felt that being there didn't bring anything and I decided to give up. However, I am always open to new ideas and if I decide that it is worth investing time in something and my activities I will definitely do it.
I saw that you have been to Brazil. I guess it was for Carnival. How was your experience taking pictures here?
Yeah, I was in Brazil this year. I really wanted to see with my own eyes what the world-famous carnival looks like. I read about the dangerous situation in Rio from the very beginning, but I didn't know what to expect. There are more and less safe countries in Europe, but that is not comparable at all. This is something completely different. In Europe I don't have to worry about the camera, I can walk with it in my hand and nothing will happen. The first time I left the hotel, people on the street came up to me and told me to hide the camera because otherwise someone would steal it. This made it very difficult for me to take pictures, because everyone was paying attention to me, most of the time probably because they were wondering how to be so stupid to walk with the camera on top. Definitely in Brazil you have to have your eyes around your head and be more careful than in Europe. Fortunately, I didn't have any unpleasant situation and I remember the carnival as a great experience. Of course, after a few days I carried my camera in my backpack, which I kept in front of me. I took out the camera, took pictures and hid it back. It was my way of taking pictures in Rio :)
How different was it from taking pictures on the streets of Poland? How people normally react to street photographers in Poland?
As I wrote earlier, it is very dangerous in Rio, but at the same time people were friendly and wonderful, very open. This makes it different from people in Poland who are rather closed and inaccessible. Surely it' s a bit of a result of our culture and history. We are less trusting and suspicious. This also results in taking pictures in Poland. Often people complain or pay attention and ask why I take pictures of them.
Are you working on any specific project right now? If yes, could you tell us about it?
Unfortunately, at the moment I am not working on any project, although I do not lack ideas. For personal reasons I have not had the time to realize it. In the near future I'm going to focus on learning new things in photography
Do you make money with photography? Or it is a hobby? If it is hobby, what is your profession?
Sometimes I make money on photography, but right now it's mostly my hobby. I am currently working as one of the managers in public administration.
What equipment do you use?
Fuji X100F
How do you see your photography today? I mean, how do you feel about your work? What would you like to explore more? What would you like to left behind?
I'm sure my approach to street photography has changed. I don't take it as seriously as I did before. It's great fun for me and I'm still passionate about it, but now I'm going to try to focus on documentary photography and as I wrote I want to learn new things.
In your portfolio, what pictures do you like more?
I think I really like multi-layered photographs, but I also pay a lot of attention to aesthetics. I like it when there is a lot going on and the frame is close.
What would you suggest for those starting to taking pictures?
In fact, you can say that I, too, am at the beginning of this journey all the time. A few years of photographing doesn't make me an expert in this field :) However, I would like people not to pay too much attention to the opinions of others. And the other way round, let them not be jealous of the successes of others.
A vida nos extremos - entrevista com Fabio Teixera e Alex Ribeiro
Os fotógrafos freelancer Fabio Teixera, de 38 anos, e Alex Ribeiro, de 36 anos, passaram o ano de 2015 atrás de histórias de gente vivendo em situações extremas no Rio de Janeiro. Realizaram mais de 20 entrevistas. Conversaram com meninos caçadores de rãs, limpadores de sepultura, caçadores de caranguejo, prostitutas. Estiveram no bairro do Caju, no Complexo do Alemão, em cemitérios, manguezais e na Vila Mimosa, uma das mais famosas áreas de prostituição do país. Este ano, diz dupla, vão reunir as histórias em um documentário e, as fotos feitas em paralelo, em uma exposição, ainda sem data definida. O nome de ambas será Sobreviver.
A ideia surgiu durante um café. Colegas de profissão, os dois se conheceram na cobertura de eventos que viraram notícia no Rio de Janeiro e logo perceberam que tinham interesses comuns para além do jornalismo. A ambição de ambos era também fazer documentários sobre questões sociais, como “Vivendo um outro olhar”, o filme que levou Teixeira, paulista de Piracicaba, a conhecer a atual noiva, Ingrid Cristina, e a se mudar para o Rio, em 2009 – Ingrid também é fotógrafa e aprece no documentário. Decidiram, então, unir esforços em um projeto comum.
Na entrevista a seguir, Teixeira e Ribeiro falam sobre suas carreiras, sobre o documentário e a foto campeã do prêmio Nikon deste ano, vencido por Teixeira.
Como surgiu o interesse de vocês por fotografia?
Ribeiro – Desde os 15 anos, quando ganhei uma câmera Mirage, eu ficava tão ansioso para ver os resultados da revelação, que ia sempre um dia antes do prometido. Daí descobri a paixão pela fotografia. Até hoje eu sou assim, quando vou revelar um filme. Aos 21 anos, comecei a vida profissional fazendo fotos sociais para amigos e vizinhos. Depois de dois anos, queria fazer fotojornalismo. Saí para a rua para montar um portfolio e não parei mais.
Teixeira – Começou em 1992, eu era assistente de casamentos. Fazia assistência de estúdio, publicidade, books, casamentos. Já gostava muito. Tinha uns 15 anos, na época. Fiquei oito anos nesse ramo. Depois comecei a fotografar para um jornal da minha cidade, no interior de São Paulo, o jornal A Tribuna de Piracicaba. Fiquei quatro anos. Depois comecei a fazer trabalhos pra agência Folhapress, já em 2004.
Mas você, Fabio, hoje mora no Rio de Janeiro, certo ?
Teixeira – Sim, moro aqui agora. Minha noiva é carioca. Mudei de Piracicaba para o Rio em 2008 ou 2009. Ganhamos um apartamento do meu sogro, depois de um ano de namoro. Mudei para morar com ela. Antes, eu morava em Piracicaba. Conheci ela através de um documentário que vi no YouTube, chamado “Vivendo um outro olhar”, do Guilherme Planel. Ela aparece no filme. Ficamos amigos, depois ela veio à minha cidade passar uns dias.
Vocês dois trabalham como freelas? Para quem?
Teixeira – Sim. Corbis, UNICEF, Cruz Vermelha, HBO, CNN, Reuters, AFP, Folha, BBC, ONU, Vice, Veja, Uol. E faço trabalhos documentais.
Ribeiro –The Sun, Dailymail e Estadão Conteúdo, como colaborador.
Como surgiu a ideia do documentário Sobreviver?
Ribeiro – Nos conhecemos cobrindo pautas. No convívio com o Fábio, descobri que tínhamos a mesma ideia de fazer fotos documentais. Então, eu e ele pensamos em trabalhar juntos em um projeto, pensamos em um assunto bem extremo, pessoas que vivem em condições extremas de sobrevivência. Daí saiu o documentário Sobreviver.
Teixeira – A ideia surgiu um dia em que estávamos tomando um café. Com o tema definido, eu e o Alex começamos a documentar as comunidades no Rio.
Quando começou e em que pé está o trabalho?
Teixeira – Começamos há um ano e três meses e estamos já na fase final. Em breve, começaremos a fase de edição. Entrevistamos umas 20 pessoas. Gente que vive no mangue, em favelas do Rio, como o Alemão, Pantanal e Caju. Esperamos lançar ainda em 2016. Essa é a ideia. Na primeira fase do projeto, éramos só eu e o Alex. Agora, na edição, Planel (Guillermo Planel) está nos ajudando. Fizemos vídeos e fotografia, e vamos fazer exposição também. A exposição não tem data, mas vai rolar. Faz parte do projeto.
Ribeiro – As fotos fazem parte do documentário. Será um filme de fotos e vídeos, contando histórias.
Como selecionaram os personagens? Por profissão?
Teixeira – Sim, profissões diferentes. Meninos caçadores de rãs, limpador de sepultura, caçadores de caranguejo, prostituição da Vila Mimosa.
Vocês já conheciam alguns? Como foi convencê-los a participar?
Teixeira – Não conhecíamos ninguém. Só na Mimosa, foram sete meses de trabalho.
Tem um trabalho de ganhar confiança, né?
Teixeira – Sim. Mas, a cada história, uma nova lição. Na Vila Mimosa, havia uma mulher que fazia oração antes de ir fazer os trabalhos dela, os programas.
Ribeiro – Cada espaço que fotografamos foi conquistado com muita conversa e tempo. Ninguém chega lá de uma hora para outra e começa a fotografar. Primeiro ficamos bem conhecidos no local. Depois ganhamos a confiança. Daí surgiram os primeiros clicks. É claro que nem todas aceitavam ser fotografadas. Mas as que permitiam, a agente não perdia tempo. A câmera sempre era direcionada para as meninas, mas eu ficava esperando passar clientes e curiosos, para dar aquela composição. Tinha clientes que não se importavam com as lentes. Aí já viu, era tudo que queríamos. Mas nem todos se agradavam com a nossa presença. A maioria não gostava.
Qual o momento que mais te marcou durante todo o processo?
Ribeiro – Na Vila Mimosa, uma garota de programa, cheirando cocaína em cima de uma lixeira.
Qual a principal dificuldade que enfrentaram? Por quê?
Ribeiro – A principal dificuldade é o tempo, pois eu trabalho, e nem sempre o tempo do Fábio é o meu tempo. Para ser documentarista, tem que ter muito tempo e muita paciência.
Fabio, você acaba de vencer um concurso, o "Eu sou o Natal", da Nikon. Pode nos contar um pouco os bastidores da foto que venceu?
Teixeira – Foi feita no final de 2015. Fui acompanhar um Papai Noel na favela de Ramos, que é um garoto de 14 ou 15 anos, morador da Maré. Uma academia doa brinquedos todos e ele ajuda a entregar. Fica perto da minha casa. Minha mulher acompanha a entrega dos presentes há cinco anos e, eu, há dois.
É seu primeiro prêmio?
Teixeira – É, sim.
Foco social - entrevista com Tércio Teixeira
Tércio Teixeira, um dos cinco membros do R.U.A. Foto Coletivo, faz parte de uma corrente de profissionais da imagem que acredita no potencial de transformação social da fotografia. Ao lado de Rodrigo Zaim, Jardiel Carvalho, Isabella Lanave e Felipe Paiva, participou ativamente da cobertura das Jornadas de Junho de 2013 e de uma série de outras manifestações que pipocaram pelo Brasil desde então. Em paralelo, registra continuamente a violência latente e a dura realidade do dia a dia em comunidades cariocas e paulistas como forma de levar as pessoas à reflexão e chamar a atenção para problemas negligenciados por boa parte dos grandes veículos de comunicação.
Um dos exemplos mais recentes do trabalho de Teixeira é a exposição Essência, aberta até o dia 21 de junho, no Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro (Avenida Vereador Alceu de Carvalho n.1020). Nela, ele reúne imagens feitas em um período de três anos, em comunidades paulistas e cariocas. Nas palavras do próprio Teixeira, a exposição mostra crianças que, não obstante viverem em meio ao caos, a violência e a miséria, preservam a integridade e virtudes que constituem a sua essência. O objetivo da mostra, diz, é jogar luz e angariar apoio para o projeto de oficina de fotografia idealizada pelo pastor Julio Mesquita, que será realizado na igreja batista Novo Horizonte, para crianças das comunidades César Maia e adjacências. Das 21 fotografias expostas, três serão leiloadas no dia 20 e, as demais, vendidas para apoiar a iniciativa.
Na entrevista que segue, Teixeira, hoje com 34 anos, fala sobre sua história na fotografia, a origem da exposição Essência, o papel político da fotografia e projetos paralelos por vir.
De onde vêm o seu gosto por fotografia?
Tive influência do meu pai fotografo, que tinha loja de fotografia. Cresci vendo ele revelar rolos de filme em laboratório. Comecei a fotografar na adolescência, com uma Zenit do meu pai, e me formei pelo Senac, em 2006.
Que temas te interessam? Por quê?
Tenho interesse por diversos temas, porém me dedico mais a causas humanistas, entre elas desigualdade social, miséria e abandono, entre outros. Vejo que através da fotografia temos uma ferramenta importantíssima para abordar assuntos pelos quais grande parte da mídia não se interessa. Nasci em uma comunidade em que a violência e o abandono ainda são presentes e com isso posso mostrar, através da minha fotografia, o que cresci vendo e ainda vejo. A fotografia tem o papel de aproximar as pessoas dos fatos sociais e políticos, denunciar o abuso de autoridade, além de trazer a reflexão através da qual se buscam ações e soluções.
Fale um pouco sobre a exposição Essência, o trabalho que está expondo atualmente no Rio, no Recreio dos Bandeirantes?
A exposição veio para descortinar o projeto de oficina de fotografia que será realizada na igreja batista Novo Horizonte para as crianças das comunidades do César Maia e adjacências, idealizada pelo pastor Julio Mesquita. A exposição mostra crianças que, não obstante viverem em meio ao caos, a violência e a miséria, preservam a integridade e virtudes que constituem a sua essência. Assim propõe algumas reflexões tais como: quais as perspectivas dessas crianças? Quais caminhos elas tem? Nós, como sociedade, somos responsáveis? Como podemos oferecer alternativas dignas? As fotos foram realizadas em comunidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
Como e quando surgiu a ideia do projeto?
Estávamos com um projeto em mente, de fotografar casamento de noivos que não tem condições de pagar por um álbum. Paramos na Comunidade Batista Novo Horizonte (CBNH) e o pastor Julio não só abraçou a idéia como convidou para o projeto da oficina de fotografia, topamos na hora e o projeto doa noivos acabou sendo adiado.
Qual o fio condutor?
O pastor Julio Mesquita vem desenvolvendo diversas atividades educativas e culturais na comunidade César Maia e adjacências. Quando ele me conheceu, pensou na hora neste projeto. Não houve um planejamento. Estamos metendo a cara e pedindo ajuda para dar continuidade.
Quanto tempo levou fotografando e que equipamento usou?
Tem fotos do ano de 2012 a 2015. Utilizei a D7000 (Nikon).
O convite para a exposição diz que a renda de fotos do projeto leiloadas vai para a oficina de fotografia voltada aos jovens carentes? O que espera com o projeto, em termos sociais?
A meta é principalmente produzir “bons” cidadãos, buscando preservar a essência da criança, abrindo oportunidades. Não é à toa que as crianças são consideradas “o futuro da nação”.
O projeto terá algum desdobramento em livro ou mesmo no site do R.U.A? Você pretende continuar a fotografar a comunidade?
A princípio não será publicado em livro. Algumas fotos da exposição foram publicadas no site, outras era inéditas. Quanto ao projeto da oficina, ao final do curso haverá uma exposição com as fotos dos alunos. Certamente continuarei fotografando as comunidades. Mas sempre procurarei fazer disso uma oportunidade de dar visibilidade para os problemas que afligem essa parte da sociedade mais carente, e não uma exploração.
São quantas fotos e quantas serão leiloadas?
São 21 fotos. Três serão leiloadas e as demais estão a venda. Quem desejar comprar pagará o preço que desejar contribuir com o projeto. Cinco já foram vendidas. O leilão ocorrerá dia 20 de junho deste ano.
Como tem sido a repercussão?
Felizmente, foi um sucesso. Apenas duas pessoas da comunidade disseram ter ido a alguma exposição. Foi incrível ver as pessoas verem sua primeira exposição. Ficaram encantadas com o trabalho e isso é muito gratificante.
Em que outros projetos você está trabalhando?
Estamos fazendo um trabalho no Jardim Gramacho, no município de Duque de Caxias, em parceria com o IdeMissoes, um projeto de Anderson Lima, que já tirou pessoas do tráfico e ajuda as famílias da região. Vamos retratar a vida dessas famílias, e divulgar esse projeto. Podemos adiantar que este projeto será longo.
Quem são os suas grandes referências na fotografia, aqui e lá fora? Por quê?
Os trabalhos de Cartier-Bresson, Robert Capa e James Nachtwey, são inspiradores. No Brasil, admiro muito o trabalho do Maurício Lima. Suas fotografias são humanistas, envolvem pessoas esquecidas pela sociedade. Gosto de trabalhar o lado social, por isso me identifico com esses fotógrafos.
Que equipamento costuma usar no dia a dia?
Hoje, trabalho com a Nikon D600. Gosto de trabalhar com lentes fixas.
(clique sobre a foto que abre a entrevista para ver outras imagens feitas por Tércio Teixeira)
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