Foco social - entrevista com Tércio Teixeira
Tércio Teixeira, um dos cinco membros do R.U.A. Foto Coletivo, faz parte de uma corrente de profissionais da imagem que acredita no potencial de transformação social da fotografia. Ao lado de Rodrigo Zaim, Jardiel Carvalho, Isabella Lanave e Felipe Paiva, participou ativamente da cobertura das Jornadas de Junho de 2013 e de uma série de outras manifestações que pipocaram pelo Brasil desde então. Em paralelo, registra continuamente a violência latente e a dura realidade do dia a dia em comunidades cariocas e paulistas como forma de levar as pessoas à reflexão e chamar a atenção para problemas negligenciados por boa parte dos grandes veículos de comunicação.
Um dos exemplos mais recentes do trabalho de Teixeira é a exposição Essência, aberta até o dia 21 de junho, no Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro (Avenida Vereador Alceu de Carvalho n.1020). Nela, ele reúne imagens feitas em um período de três anos, em comunidades paulistas e cariocas. Nas palavras do próprio Teixeira, a exposição mostra crianças que, não obstante viverem em meio ao caos, a violência e a miséria, preservam a integridade e virtudes que constituem a sua essência. O objetivo da mostra, diz, é jogar luz e angariar apoio para o projeto de oficina de fotografia idealizada pelo pastor Julio Mesquita, que será realizado na igreja batista Novo Horizonte, para crianças das comunidades César Maia e adjacências. Das 21 fotografias expostas, três serão leiloadas no dia 20 e, as demais, vendidas para apoiar a iniciativa.
Na entrevista que segue, Teixeira, hoje com 34 anos, fala sobre sua história na fotografia, a origem da exposição Essência, o papel político da fotografia e projetos paralelos por vir.
De onde vêm o seu gosto por fotografia?
Tive influência do meu pai fotografo, que tinha loja de fotografia. Cresci vendo ele revelar rolos de filme em laboratório. Comecei a fotografar na adolescência, com uma Zenit do meu pai, e me formei pelo Senac, em 2006.
Que temas te interessam? Por quê?
Tenho interesse por diversos temas, porém me dedico mais a causas humanistas, entre elas desigualdade social, miséria e abandono, entre outros. Vejo que através da fotografia temos uma ferramenta importantíssima para abordar assuntos pelos quais grande parte da mídia não se interessa. Nasci em uma comunidade em que a violência e o abandono ainda são presentes e com isso posso mostrar, através da minha fotografia, o que cresci vendo e ainda vejo. A fotografia tem o papel de aproximar as pessoas dos fatos sociais e políticos, denunciar o abuso de autoridade, além de trazer a reflexão através da qual se buscam ações e soluções.
Fale um pouco sobre a exposição Essência, o trabalho que está expondo atualmente no Rio, no Recreio dos Bandeirantes?
A exposição veio para descortinar o projeto de oficina de fotografia que será realizada na igreja batista Novo Horizonte para as crianças das comunidades do César Maia e adjacências, idealizada pelo pastor Julio Mesquita. A exposição mostra crianças que, não obstante viverem em meio ao caos, a violência e a miséria, preservam a integridade e virtudes que constituem a sua essência. Assim propõe algumas reflexões tais como: quais as perspectivas dessas crianças? Quais caminhos elas tem? Nós, como sociedade, somos responsáveis? Como podemos oferecer alternativas dignas? As fotos foram realizadas em comunidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
Como e quando surgiu a ideia do projeto?
Estávamos com um projeto em mente, de fotografar casamento de noivos que não tem condições de pagar por um álbum. Paramos na Comunidade Batista Novo Horizonte (CBNH) e o pastor Julio não só abraçou a idéia como convidou para o projeto da oficina de fotografia, topamos na hora e o projeto doa noivos acabou sendo adiado.
Qual o fio condutor?
O pastor Julio Mesquita vem desenvolvendo diversas atividades educativas e culturais na comunidade César Maia e adjacências. Quando ele me conheceu, pensou na hora neste projeto. Não houve um planejamento. Estamos metendo a cara e pedindo ajuda para dar continuidade.
Quanto tempo levou fotografando e que equipamento usou?
Tem fotos do ano de 2012 a 2015. Utilizei a D7000 (Nikon).
O convite para a exposição diz que a renda de fotos do projeto leiloadas vai para a oficina de fotografia voltada aos jovens carentes? O que espera com o projeto, em termos sociais?
A meta é principalmente produzir “bons” cidadãos, buscando preservar a essência da criança, abrindo oportunidades. Não é à toa que as crianças são consideradas “o futuro da nação”.
O projeto terá algum desdobramento em livro ou mesmo no site do R.U.A? Você pretende continuar a fotografar a comunidade?
A princípio não será publicado em livro. Algumas fotos da exposição foram publicadas no site, outras era inéditas. Quanto ao projeto da oficina, ao final do curso haverá uma exposição com as fotos dos alunos. Certamente continuarei fotografando as comunidades. Mas sempre procurarei fazer disso uma oportunidade de dar visibilidade para os problemas que afligem essa parte da sociedade mais carente, e não uma exploração.
São quantas fotos e quantas serão leiloadas?
São 21 fotos. Três serão leiloadas e as demais estão a venda. Quem desejar comprar pagará o preço que desejar contribuir com o projeto. Cinco já foram vendidas. O leilão ocorrerá dia 20 de junho deste ano.
Como tem sido a repercussão?
Felizmente, foi um sucesso. Apenas duas pessoas da comunidade disseram ter ido a alguma exposição. Foi incrível ver as pessoas verem sua primeira exposição. Ficaram encantadas com o trabalho e isso é muito gratificante.
Em que outros projetos você está trabalhando?
Estamos fazendo um trabalho no Jardim Gramacho, no município de Duque de Caxias, em parceria com o IdeMissoes, um projeto de Anderson Lima, que já tirou pessoas do tráfico e ajuda as famílias da região. Vamos retratar a vida dessas famílias, e divulgar esse projeto. Podemos adiantar que este projeto será longo.
Quem são os suas grandes referências na fotografia, aqui e lá fora? Por quê?
Os trabalhos de Cartier-Bresson, Robert Capa e James Nachtwey, são inspiradores. No Brasil, admiro muito o trabalho do Maurício Lima. Suas fotografias são humanistas, envolvem pessoas esquecidas pela sociedade. Gosto de trabalhar o lado social, por isso me identifico com esses fotógrafos.
Que equipamento costuma usar no dia a dia?
Hoje, trabalho com a Nikon D600. Gosto de trabalhar com lentes fixas.
(clique sobre a foto que abre a entrevista para ver outras imagens feitas por Tércio Teixeira)
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