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Pelas ruas polonesas - entrevista com Katarzyna Kubiak

A fotógrafa polonesa Katarzyna Kubiak, de 35 anos, iniciou na fotografar aos 30 anos, idade em que muita gente já se considera velha para aprender qualquer coisa. Funcionária pública em Varsóvia, começou tirando fotos com o celular no dia a dia e em viagens, até vencer com uma delas um concurso. A qualidade do arquivo gerada pelo aparelho, porém, impediu que participasse da exposição com os vencedores e a levou a comprar uma câmera melhor.

Com o equipamento novo, passou a levar a fotografia de rua mais a sério. Fez parte de dois coletivos (Streetical Collective e un-posed) e se inscreveu em outros concursos. Venceu ou recebeu menções honrosas em quatro: International Photography Awards (2015), Moscow International Photo Awards (2016), Leica Street Photo (2016) e Human DOC Proclub Camera (2016). Teve fotos publicadas no World Street Photography Book, no Debuts (2016), na Street Photography Magazine, no Street Photography in the World Book vol. 1, na Eye Photo Magazine e na PhotoVogue, da Vogue italiana. Em paralelo, aos poucos, foi ganhando visibilidade nas redes sociais - hoje, no Instagram, tem mais de 20 mil seguidores.

Este ano, esteve no Rio de Janeiro, para o Carnaval. Apesar do receio em relação à violência na cidade, e dos alertas dados por cariocas na rua já por aqui, fotografou a festa.

Na entrevista a seguir, Katarzyna fala sobre sua trajetória, a experiência de fotografar no Brasil, a diferença de fotografar na Polônia, as dificuldades de conciliar a vida pessoal com a fotografia, a fotografia de rua e seus planos para o futuro como fotógrafa documental.

Quando você começou a seu interesse pela fotografia?  

Comecei a me interessar por fotografia no final de 2014. Fotografava tudo que de alguma forma me interessava. Na época, eu tirava fotos com meu telefone celular. Por acaso, venci um concurso de fotografia, mas por causa da baixa qualidade da foto do meu celular, minha foto não pode fazer parte da exposição. Fui desclassificada e lamentei muito. Então, decidi comprar uma câmera.

O que mais atrai você na fotografia?

É difícil dizer, mas acho que é a beleza na fotografia. O tempo todo me surpreendo com algo em diferentes tipos de fotografia. 

Por que você escolheu a fotografia de rua?

Eu não posso dizer que escolhi a fotografia de rua porque foi um processo natural. É apenas a forma que funciona melhor para mim.

Quais os maiores desafios na fotografia de rua? E o que você mais gosta?

Os desafios na fotografia de rua são o que eu mais gosto. Eu acho que é uma curiosidade em relação ao que você pode ver e como vai mostrar isso. O maior desafio é tirar uma foto que vai interessar outras pessoas. Produzimos tantas fotos hoje em dia que é muito difícil fazer isso.

Onde você costuma fotografar com mais frequência?

Eu normalmente tiro fotos durante minhas viagens, principalmente porque eu não tenho tempo para fazer isso todos os dias. Trabalhar e cuidar da minha filha toma a maior parte do meu dia. Recentemente, principalmente nos finais de semana, e com cada vez mais frequência, saio para tirar fotos em minha cidade natal.

Como você escolhe os temas que vai fotografar?

Eu tiro a fotos principalmente em minhas viagens. Então esses são normalmente os lugares que eu quero ver no país que estou visitando.

Você poderia descrever sua rotina quando está fotografando?

Eu acho que trato isso agora mais como uma forma de caminhar e tirar fotos. Eu nunca sigo uma rotina. Eu simplesmente ando e tiro fotos de tudo que acho interessante.

Muitas cenas em suas fotos são engraçadas. Quais são suas principais influências, em fotografia e em outras áreas que você acha que influenciam a sua forma de ver?

Ao contrário do que você notou, eu gosto mais de fotos visualmente bonitas do que das engraçadas. Acho que é por causa do meu amor pelo cinema. Acho que explica muito sobre como eu fotografo.

Poderia citar outros fotógrafos de rua de sua geração que você admira, mas que não necessariamente referências para você?

Eu constantemente descubro novos excelentes fotógrafos e não seria possível eu nomear todas as pessoas que eu admiro aqui. Eu também não sou boa em lembrar nomes, eu tenho mais facilidade de identificá-los pelas fotos que tiram. 

Você integra dois coletivos de fotografia. Como isso ajuda você?

Eu não estou em nenhum coletivo no momento, mas não  estou excluindo a possibilidade. Há algum tempo atrás, eu senti que fazer parte dos coletivos não me trazia nada e decidi sair. No entanto, estou sempre aberta para novas ideias e, se decidir que vale a pena investir tempo em algo, ou em minhas atividades, certamente foi fazê-lo.

Eu vi que você esteve no Brasil. Acho que foi no Carnaval. Como foi sua experiência fotografando aqui?

Sim, eu estive no Brasil este ano. Eu queria realmente ver com os meus próprios olhos como o mundialmente famoso Carnaval se parece. Eu li sobre a situação perigosa no Rio de Janeiro desde o começo, mas eu não sabia o que esperar. Há países mais e menos seguros na Europa, mas não há comparação, de forma alguma. É algo completamente diferente. Na Europa, eu não preciso me preocupar com a câmera, posso andar com ela na mão e nada vai acontecer. A primeira vez que eu saí do hotel, as pessoas na rua vieram até mim e me disseram para esconder a câmera, porque de outra forma alguém iria roubá-la. Isso dificultou muito para mim tirar fotos, porque todos estavam prestando atenção em mim. A maior parte do tempo, provavelmente, imaginando como alguém poderia ser tão estúpido de andar com uma câmera à mostra. No Brasil, definitivamente você tem que ter os olhos na nuca e ter mais cuidado do que na Europa. Felizmente, não passei por nenhuma situação desagradável e lembro do Carnaval como uma excelente experiência. Claro, depois de alguns dias carregando minha câmera na mochila, que eu levo à minha frente. Eu tirava a câmera, fazia as fotos e escondia de volta. Foi o meu jeito de fotografar no Rio.  

Quão diferente foi de tirar fotos nas ruas da Polônia? Como as as pessoas normalmente reagem a fotógrafos de rua na Polônia?

Como eu escrevi, o Rio é muito perigoso. Mas, ao mesmo tempo, as pessoas era amigáveis e maravilhosas, muito abertas. Isso as torna diferentes das pessoas na Polônia, que são bastante fechadas e inacessíveis. Certamente, é algo que reflete nossa cultura e história. Somos mais desconfiados. E isso também tem efeito quando se tira fotos na Polônia. Frequentemente, as pessoas reclamam, prestam atenção e perguntam porque estou tirando fotos delas.     

Você está trabalhando em algum projeto atualmente?

Infelizmente, no momento não estou trabalhando em nenhum projeto, embora não me faltem ideias. Por razões pessoais, eu não tenho tido tempo para realizá-las. Em um futuro próximo, eu vou me focar em aprender coisas novas em fotografia. 

Que equipamento você usa?

Eu uso uma Fuji X100F

Como você vê a sua fotografia hoje? Como você se sente em relação ao seu trabalho? O que você gostaria de explorar mais? O que você pretende deixar para trás?

Eu tenho certeza de que minha abordagem na fotografia de rua mudou. Eu não levo mais tão a sério como levava antes. Ainda me divirto muito com e sou apaixonada pela prática, mas agora vou tentar me focar em fotografia documental e, como escrevi antes, quero aprender coisas novas. 

Que fotografias do seu portfólio você gosta mais?

Eu acho que realmente gosto de fotografias com multiplos planos, mas eu também presto muita atenção à estética. Eu gosto quando há várias coisas acontecendo e o enquadramento está próximo.

O que você sugeriria para quem está começando a tirar fotos?

De fato, você pode dizer que eu também estou no começo dessa jornada o tempo todo. Alguns anos de fotografia não me tornam uma especialista nessa áreas. No entanto, eu gostaria que as pessoas não prestassem tanta atenção às opiniões do outros. E, por outro lado, não tivessem ciúmes do sucesso dos outros.

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Through the Polish streets - interview with Katarzyna Kubiak

Polish photographer Katarzyna Kubiak, 35, started shooting at the age of 30, when many people already consider themselves old enough to learn anything. A civil servant in Warsaw, she started taking pictures with her cell phone on a daily bases and on trips, until she won a contest with one of them. The quality of the file generated by the device, however, prevented her from participating in the exhibition with the winners and led her to buy a better camera.

With the new equipment, she took street photography more seriously. She was part of two collectives (Streetical Collective and un-posed) and entered other contests. She has won or received honorable mentions in four of them: International Photography Awards (2015), Moscow International Photo Awards (2016), Leica Street Photo (2016) and Human DOC Proclub Camera (2016). Her photos have been published in the World Street Photography Book, Debuts (2016), Street Photography Magazine, Street Photography in the World Book vol. 1, in Eye Photo Magazine and PhotoVogue by Vogue Italy. In parallel, she has been gaining visibility on social networks - on Instagram, se has now more than 20 thousand followers.

This year, she went to Rio de Janeiro for Carnival. Despite fears about violence in the city, and warnings given by cariocas on the streets, she photographed the party.

In the following interview, Katarzyna talks about her career, the experience of taking pictures in Brazil, the difference in photography in Poland, the difficulties of balancing personal life and photography, street photography and her plans for the future as a documentary photographer.

When and how did your interest for photography started?

I started to be interested in photography at the end of 2014. I photographed everything that somehow interested me. I was taking pictures with my mobile phone at the time. By chance, I won a photo contest, but because of the very poor quality of the photo from my phone, my photo could't take part in the exhibition. I was disqualified and I was very sorry. Then I decided to buy a camera.

What attract you most in photography?

It's hard to say, but I think beauty in photography. All the time I am surprised by something in different types of photography

Why did you chose street photography?

I can't say I choose street photography because it became quite natural. It's just a form that suits me the most

What are the biggest challenge in street photography? And what do you like more about it?

Challenges in street photography are also what I like the most. I think it's a curiosity about what you can see and how you can show it. The biggest challenge, in my opinion, is to take a photo that will interest others. We are producing so many pictures now that it is very difficult to do so.

Where do you take pictures more frequently? 

I usually take pictures during my travels, mainly because I don't have time to do it every day. Working and raising my daughter takes me most of the day. Recently, mainly on weekends, I go out to take pictures in my hometown more and more often.

How do you choose the themes and places you will photograph? 

As I wrote earlier, I take pictures mainly during my travels, so these are usually the places I want to see in the country I'm visiting.

Could you please describe your routine when you are taking pictures? 

I think I treat it now more as a form of walking and taking pictures. I never have the usual routine. I just walk and take pictures of everything I find interesting.

Many scenes in your pictures are funny. What are your main influences, in photography and other fields that you think have influenced your way of seeing?

Contrary to what you've noticed, I like visually pretty pictures more than funny ones. I think it's because of my love for cinema. I think it's a big part of how I take pictures.

Could you quote other street photographer of you generation that you admire, but are not necessarily references? 

I am constantly discovering new great photographers and there's no way I can name all the people I admire here. I am also not good at remembering names, I am more familiar with other photographers after the pictures they took. 

You integrate two photography collectives. How does it helps you?  

I'm not in any collective right now, but I'm not excluding anything. Some time ago I felt that being there didn't bring anything and I decided to give up. However, I am always open to new ideas and if I decide that it is worth investing time in something and my activities I will definitely do it.  

I saw that you have been to Brazil. I guess it was for Carnival. How was your experience taking pictures here? 

Yeah, I was in Brazil this year. I really wanted to see with my own eyes what the world-famous carnival looks like. I read about the dangerous situation in Rio from the very beginning, but I didn't know what to expect. There are more and less safe countries in Europe, but that is not comparable at all. This is something completely different. In Europe I don't have to worry about the camera, I can walk with it in my hand and nothing will happen. The first time I left the hotel, people on the street came up to me and told me to hide the camera because otherwise someone would steal it. This made it very difficult for me to take pictures, because everyone was paying attention to me, most of the time probably because they were wondering how to be so stupid to walk with the camera on top. Definitely in Brazil you have to have your eyes around your head and be more careful than in Europe. Fortunately, I didn't have any unpleasant situation and I remember the carnival as a great experience. Of course, after a few days I carried my camera in my backpack, which I kept in front of me. I took out the camera, took pictures and hid it back. It was my way of taking pictures in Rio :)

How different was it from taking pictures on the streets of Poland? How people normally react to street photographers in Poland?

As I wrote earlier, it is very dangerous in Rio, but at the same time people were friendly and wonderful, very open. This makes it different from people in Poland who are rather closed and inaccessible. Surely it' s a bit of a result of our culture and history. We are less trusting and suspicious. This also results in taking pictures in Poland. Often people complain or pay attention and ask why I take pictures of them.

Are you working on any specific project right now? If yes, could you tell us about it?

Unfortunately, at the moment I am not working on any project, although I do not lack ideas. For personal reasons I have not had the time to realize it. In the near future I'm going to focus on learning new things in photography

Do you make money with photography? Or it is a hobby? If it is hobby, what is your profession?

Sometimes I make money on photography, but right now it's mostly my hobby. I am currently working as one of the managers in public administration.

What equipment do you use?

Fuji X100F

How do you see your photography today? I mean, how do you feel about your work? What would you like to explore more? What would you like to left behind?

I'm sure my approach to street photography has changed. I don't take it as seriously as I did before. It's great fun for me and I'm still passionate about it, but now I'm going to try to focus on documentary photography and as I wrote I want to learn new things.

In your portfolio, what pictures do you like more?

I think I really like multi-layered photographs, but I also pay a lot of attention to aesthetics. I like it when there is a lot going on and the frame is close. 

What would you suggest for those starting to taking pictures?

In fact, you can say that I, too, am at the beginning of this journey all the time. A few years of photographing doesn't make me an expert in this field :) However, I would like people not to pay too much attention to the opinions of others. And the other way round, let them not be jealous of the successes of others.  

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Arte na fotografia - entrevista com Claudio Edinger

Nascido no Rio de Janeiro, em 1952, Claudio Edinger é dono de uma estética difícil de confundir. Suas imagens, já há muitos anos, trazem poucos elementos em foco. O restante permanece sem nitidez, como em tilt-shift. Muitas das imagens feitas assim são retratos, paisagens urbanas ou fotos aéreas de cidades como o Rio de Janeiro, São Paulo, Paris e Nova York, ou de regiões como a Toscana. Mudam a perspectiva de quem vê, apresentam um mundo em que grandes prédios, muitas vezes, parecem miniaturas.  

Em sua longa e prolífica trajetória na fotografia, Edinger publicou fotos em mais de 56 veículos, no Brasil e no exterior, entre os quais Business Week, Conde Nast’s Traveler, Marie Claire, Elle, National Geographic, New York Times Magazine, Paris Match, Valor, Veja e The Washington Post. Prêmios e bolsas, foram ao menos 14. Exposições, foram mais de 80, desde 1975. Livros publicados, são quase 20, entre os quais os dedicados ao lendário Hotel Chelsea; a praia de Venice, na Califórnia; o Carnaval brasileiro e a loucura.  

Este ano, já lançou um livro e uma exposição. O livro, História da fotografia autoral e a pintura moderna, é resultado de uma pesquisa de cerca de dez anos. A exposição é mais uma etapa do projeto Machina Mundi, de fotos aéreas feitas em diversos países.

Na entrevista a seguir, Edinger fala sobre as origens do novo livro, as diferenças de  formação e perfil dos fotógrafos brasileiros e americanos (Edinger morou 20 anos nos EUA), os projetos que têm em andamento, seu processo criativo e sua visão sobre o futuro da fotografia, em um momento em que a popularização dos telefones celulares torna a prática acessível a um número inédito e crescente de pessoas no mundo.

O que o levou a escrever "História da fotografia autoral e a pintura moderna"? Que papel espera que a obra tenha para os fotógrafos e a fotografia brasileira?

Tenho dado cursos de fotografia há 40 anos. Quando voltei para o Brasil, depois de 20 anos fora (nos Estados Unidos), notei que temos muito talento, mas pouca cultura fotográfica. Sem cultura é impossível ser um bom fotógrafo autoral. Aí comecei a pesquisar de onde vinha o meu conhecimento. Uma coisa foi puxando a outra e quando percebi tinha material suficiente para um livro. Espero que este livro sirva de impulso para os jovens artistas brasileiros. O livro não tem nenhuma pretensão. O que temos que saber é muito, e este livro é só um balde do oceano. Mas é um bom começo, espero, para fotógrafos e para o público em geral perceber (quem ainda não notou) a imensa dimensão de nossa arte, em todas as direções.

Como avalia a formação dos fotógrafos brasileiros em história da arte? E de que forma isso impacta a qualidade da fotografia brasileira?

Tenho visto que quando menciono alguns nomes nos workshops ninguém conhece. Daí concluí que nossa cultura é deficiente. Como é deficiente nossa educação. Mas temos uma criatividade absurda, o que é muito bom. Com um pouco de educação, iremos a lugares pouco explorados. É só reparar a nossa riqueza musical. Rítmos e estilos variados — esta é a nossa natureza, somos uma mistura de raças que vai dar muito certo, principalmente no que diz respeito à arte, à economia criativa. Só é preciso um pouco de investimento nisso.

Você viveu duas décadas nos Estados Unidos. De modo geral, quais as diferenças fundamentais (de formação e estilo) entre os fotógrafos de lá e daqui?

A América viveu um boom econômico absurdo no pós guerra. Investiram pesado na educação, têm possivelmente as melhores universidades do planeta, sempre acreditaram na importância da educação. A coisa funciona como uma bola de neve. Bons alunos viram bons professores que pedem por grandes museus que acabam sendo apoiados pela sociedade e tudo reverte para uma melhor educação. Mas nós temos um poder criativo incomparável. Se nos derem as mínimas condições vamos transformar nosso país em uma potência. Já estamos a caminho. Vejo isso como um movimento irreversível. 

Além de lançar o livro, este ano você já inaugurou a exposição Machina Mundi NYC. Quais os próximos projetos em vista e ou já em andamento?

A vantagem de se fazer as coisas no Brasil é que temos sempre que ter cinco ou seis projetos em andamento ao mesmo tempo para poder, enfim, viabilizar um deles. Estou fazendo um livro com fotos aéreas, Machina Mundi 2, um livro de histórias dos meus projetos (“Coisas que eu vi”). Ando pesquisando a criação de uma universidade de arte e tecnologia, quero fazer um livro sobre Jerusalém, outro sobre a China. Quem fica parado é poste.

Nos últimos anos, com as câmeras digitais, a fotografia se popularizou. Hoje, todo mundo se acha um pouco fotógrafo. É possível comprar fotos em grandes bancos de imagens a por centavos. Por outro lado, o preço dos equipamentos de qualidade ainda é muito alto. Qual a sua visão sobre o futuro da fotografia? Haverá espaço para que tipo de profissional?

Sempre haverá espaço para os profissionais — de moda, publicidade, jornalismo, gastronomia, arquitetura e casamento. Mas a fotografia autoral, que é a que me interessa, é a que mais tem evoluído. As redes sociais são de extrema valia. Poder publicar o que fazemos ajuda-nos a  avaliar nosso trabalho, a corrigir os erros, a aprofundar a pesquisa. A fotografia se transformou na pintura do século 21. As obras sendo produzidas, e também os altíssimos preços, na casa dos milhões de dólares, de algumas delas, têm demonstrado isso. 

Hoje, quase todo mundo fotografa com celular. As câmeras dos smartphones são cada vez melhores. Mesmo fotógrafos profissionais, cada vez mais, utilizam o celular, até pela praticidade. Mas praticamente todos os aparelhos tem um mesmo tipo de lente, as 28mm. Essa homogeneização impacta de alguma forma a estética fotográfica do nosso tempo? Se sim, de que forma? Há paralelos como outros períodos da história, como quando surgiram as câmeras 35mm, por exemplo?

Vivemos uma época sem precedentes na história. Principalmente na história da fotografia. Os smartphones têm revolucionado nosso olhar. A câmera agora é onipresente. Todo mundo está sendo alfabetizado, por assim dizer, em imagens fotográficas. É um revolução cultural comparável (mas muito superior) ao do aparecimento da escrita — as épocas são absolutamente diferentes. Não acredito em homogeneização da imagem, pelo menos nas imagens que importam. O photoshop e os aplicativos abrem absurdas possibilidades. O que fotografamos hoje é só uma linha — a pipa está lá em cima…

Como é hoje seu processo de criação? Como define os temas que vai fotografar?

Eu acredito que a fotografia é uma força da Natureza e comigo tem sido sempre assim. As situações vão aparecendo, a fotografia vai puxando a gente. Este trabalho com imagens aéreas, por exemplo, aconteceu por acaso porque me pediram uma foto do Maracanã. Acabei fotografando o Rio e assim começou. 

Que novos fotógrafos ou correntes fotográficas hoje chamam a sua atenção no Brasil e no mundo?

No Brasil temos uma lista gigante de talentos antigos e novos e não vou citar nomes para não esquecer de ninguém. Mas em meu livro você tem os fotógrafos que pra mim são relevantes hoje em dia. Quanto às correntes fotográficas, são muitas, em todas as direções, desde auto-retratos incríveis, até stills de cinema, até construções surreais. A fotografia cresce horizontalmente e, a cada dia, aparecem talentos e obras novas. É lindo de se ver.

Como avalia a fotografia brasileira hoje? Por quê?

Nossa fotografia está entre as cinco mais importantes do mundo e com um pouco de ajuda vai pro topo. Somos uma jovem nação com um talento atávico extraordinário. Vivemos um momento fantástico, ainda mais diante de todas as dificuldades que enfrentamos. Ou talvez exatamente por isso.

Que equipamentos tem usado atualmente?

Uso uma Canon 5D Mark IV e um drone Mavic Pro 2 com câmera Hasselblad.

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Cia solo – entrevista com Pio Figueiroa

Foto: Pio Figueiroa - uma das imagens do projeto Ver do Meio, exposto em maio em São Paulo

Foto: Pio Figueiroa - uma das imagens do projeto Ver do Meio, exposto em maio em São Paulo

O fotógrafo recifense Pio Figueiroa integrou o que foi provavelmente o mais influente coletivo de fotografia brasileiro dos anos 2000. Depois de uma temporada de oito anos de fotojornalismo, com passagens pelo Jornal do Commercio, Editora Abril, Editora Três e Valor Econômico, fundou em 2003, com Rafael Jacinto, João Kehl e Carol Lopes, a Cia de Foto.

A Cia ficou conhecida por assinar coletivamente seus trabalhos, por uma forte pós produção das imagens e pela experimentação estética. Publicou em revistas brasileiras, como Veja, Revista da Folha e IstoÉ, e em títulos estrangeiros de peso, como Time Magazine, Newsweek e National Geographic, além de ganhar notoriedade por uma série de projetos autorais.

Um dos mais conhecidos é “Caixa de Sapato”, registro da vida pessoal e da intimidade dos integrantes, exposto no Museu de Arte Moderna de São Paulo (2008) e na Photographer’s Gallery, de Londres (2009). Outros, são “25 de Março”, sobre a rua de comércio popular paulistana, com o qual entraram para a Coleção Pirelli Masp, e “Carnaval”, uma série que foca rostos vistos de cima, em meio à multidão em festa, exposto na Photoquai de 2011, em Paris.

Com o fim da Cia de Foto, em 2013, Pio saiu em carreira solo. Nesta entrevista, ele fala sobre sua trajetória na fotografia, os projetos aos quais se dedica desde então e sobre a recente exposição "Ver do Meio", sobre a cidade de São Paulo, que aconteceu este ano, no Instituto Tomie Ohtake, e que, segundo Pio, vai estar em 2016 na Bienal de Arquitetura, na Itália.

Você trabalhou em jornais como o Valor Econômico e fez parte do coletivo Cia de Foto por dez anos, até ele terminar, em 2013. Quais os projetos e iniciativas a que tem se dedicado desde então?

Minha entrada na fotografia foi pelo fotojornalismo. Comecei no Jornal do Commercio, em Recife. Depois vim para São Paulo trabalhar na área editorial da Abril. Em seguida, fui para Editora Três e fiquei por lá até o projeto do Valor Econômico. Isso somado resulta em oito anos no mercado editorial. Daí surgiu a Cia de Foto, como forma de migrar desse mercado para um ambiente que permitisse mais pesquisas e projetos próprios. Hoje em dia desenvolvo meus projetos, estou sempre desenvolvendo novas historias. Sou editor de uma revista chamada Sueño de La Razon, que envolve editores de todos os países da América latina. Sou também editor do blog Icônica, junto com mais quatro professores/pesquisadores da fotografia. E estou desenvolvendo um roteiro de longa metragem via uma edital de cinema. Uma história que se relaciona com a fotografia.

Na Cia de Foto, o trabalho de vocês, tinha uma estética muito marcante, mas determinada de forma coletiva. Você tem hoje uma preocupação em buscar uma linguagem mais própria, de criar uma nova identidade visual? Se sim, de que forma tem buscado fazer isso?

Acho que sempre tive uma fotografia que flertava com a pintura. Até mesmo no jornalismo que fazia no Jornal do Commercio, fotografando em filme positivo na época (Próvia 100/ FUJI). Já ali procurava uma fotografia bastante definida pela luz, pelas cores. A Cia foi parte desse processo. Nesse sentido, continuo um procedimento que se repete agora e que vem antes da Cia, de me dedicar bastante a um lado pictórico. Não tenho muito uma preocupação de criar uma identidade, porque antes e durante o coletivo, meu procedimento de pesquisa era bem parecido, e se espelhava na experiência que tinha em fotografar com filmes cromo, nos quais a latitude era bem limitada, exigindo uma exposição mais cuidadosa, e, ao mesmo tempo, com a experiência que tinha no laboratório P&B, no qual usava muito o recurso de mascara para proteger áreas e dotar a imagem de diferentes gradações de luz e sombra. Essa pesquisa continuou e continua de forma análoga no mundo digital. E na Cia seguiu esse procedimento.

Como é, de modo geral, seu processo de trabalho? Varia de projeto para projeto? Ou existe um eixo comum entre todos eles? Que equipamento costuma usar para fotografar?

De modo geral, uso uma Canon Mark III e lentes fixas, 35mm ou 85mm. Fotografando sempre com luz natural e tentando captar as cenas em acordo com o histograma. Não ligo muito para o resultado da imagem na hora em que capto, mas prezo por um arquivo rico em informações. Depois, no Photoshop, é que chego onde quero. Esse procedimento pode ser visto como um eixo que me segue desde do início. Claro que lá atrás não havia o arquivo digital nem usava o Photoshop, mas seguia um procedimento parecido nas revelações e ampliações de meu material. Outro ponto, é que sempre fotografo situações que seguem uma abordagem de fotojornalismo. Geralmente não projeto muito o que irei fotografar. Leio a respeito, apuro, pesquiso, mas quando me lanço ao assunto deixo a vivencia compor a fotografia que expressarei.

A Cia de Foto ficou conhecida pela atuação como coletivo. O que acha de iniciativas semelhantes que surgiram desde então? Poderia citar alguns que te chamam mais a atenção?

A Cia de Foto foi pioneira em alguns aspectos, um deles foi o da produção coletiva. Mas outros se seguiram como o de romper com mercados específicos, atuar no jornalismo, na arte e na publicidade sem preconceito e conseguir ser aceito nesse meio. Outro ponto foi recorrer as pesquisa acadêmicas e aproximar essas pesquisas de nossa produção. Acho que esse três pontos, de alguma forma, ganharam uma força específica com a Cia, e hoje em dia, várias outras iniciativas super legais seguem esse movimento. Não penso com isso que foi a Cia que inventou nem um desses aspectos. Mas penso que houve uma atividade que dinamizou algo que estava como sintoma, prestes a acontecer.

O jornalismo e a fotografia relacionada a ele vivem uma crise séria de modelo de financiamento. Passar por uma redação era, e ainda é, uma etapa importante na formação de muito fotógrafos. Mas está cada vez mais difícil viver disso. Que caminhos enxerga hoje para profissionais jovens que tem a intenção de se dedicar ao fotojornalismo e à fotografia documental? E em termos de financeiros, como se bancar?

Não teria uma formula. Acho que a geração que vem aí é que vai nos ensinar como fazer. Nós fomos a geração da falência. A solução tem que vir da próxima. E eles tem que ter estima para isso, para criarem novos caminhos. Sou bem fã do Mídia Ninja, das iniciativas como a dos Jornalista Livres, e ainda espero, com entusiasmo, outras ideias e soluções. Acho que minha geração deve se colocar muito mais na condição de aprendizado do que tentar determine caminhos. Sou muito curioso pelas alternativas que a molecada pode trazer. Mas eles precisam de ensino e de uma comunidade que liberte eles ao experimentalismo.

Você expôs recentemente com os fotógrafos Mauro Restiffe e Arnaldo Pappalardo o projeto “Ver do Meio”, que teve como curador Nelson Brissac. Como surgiu a ideia da exposição?

É uma curadoria do professor Nelson Brissac. Ele parte de uma ideia de que São Paulo é uma cidade que não se deixa ver, um aglomerado de prédios que reconfiguram a nossa capacidade de uma apreensão geográfica mais convencional. Dessa ideia, ele convidou os três fotógrafos para fotografar a cidade em três abordagens, o centro da cidade, os eixos de deslocamento e as periferias.

Como foi feita a seleção das fotografias que entrariam? A quatro mãos, como o curador Nelson Brissac? Em parceria com o Mauro Restiffe e o Arnaldo Pappalardo?

O projeto teve três grandes momentos. Um início, no primeiro semestre de 2014, quando começamos a nos encontrar e discutir a abordagem. Recebemos aulas do Nelson sobre a ideia de exposição. Depois chegamos a um consenso sobre o tempo que precisaríamos para desenvolve-la, os custo de produção, etc.. Em um segundo momento, começamos o trabalho de campo. Aqui era comum nós nos encontrarmos com as fotos recém tiradas e escutar do grupo as impressões que tínhamos, assim como entender para onde estava caminhando cada pesquisa. Em um terceiro momento, veio a hora de editar e materializar a exposição. Essa parte ocorreu nos três meses que antecederam a abertura.

Vocês já haviam trabalhado juntos antes? Em que ocasiões?

Com o Nelson sim. Tinha participado de mais de um projeto anteriormente. Faz tempo que acompanho a pesquisa dele, desde dos movimentos que ele provocava com o Arte/Cidade, e as ocupações artísticas na Zona Leste. Já o Mauro, sou bem fã do trabalho. É um fotógrafo que admiro muito, acho uma pesquisa madura, significativa, importante para a historia da linguagem aqui no Brasil, no que se relaciona com a arte. O Pappalardo foi uma grande apresentação. Lembrava dele muito mais pelo trabalho na publicidade, e sempre o vi como um grande cara. Nesse ano, essa impressão se tornou certeza e foi uma convivência que promoveu uma amizade.

É interessante notar como a visão de cada um de vocês sobre a paisagem urbana é diferente. O Pappalardo fotografou muito edifícios comerciais e residenciais, as fotos são coloridas e chamativas. Tem muito da poluição visual e da mistura de cores da cidade. As fotos do Restiffe são em P&B, feitas em filme, grão bem aparente. As tuas tem principalmente pessoas.

Aqui eu acho que tem dois aspectos legais de destacar. O primeiro é a ideia do curador de procurar nessas pessoas uma complementariedade que resultasse numa exposição rica em abordagens. Nesse sentido, essa mistura de estilos tem um tanto de aposta e sensibilidade do curador. Um Segundo aspecto é perceber o quanto o grupo foi determinando a própria pesquisa do Nelson, o quanto a intenção curatorial inicial foi reformulada no embate com essas três traduções de olhares e procedimentos artísticos.

Qual a expectativa com o projeto? A ideia é levantar algum tipo de discussão que vá além da estética da fotografia? Se sim, qual?

Minha expectativa era responder as provocações que o próprio grupo engendrava. Como eram pessoas fortes, dedicadas ao trabalho, o ambiente foi muito combatível, e pensar no processo, ou dar conta do processo já foi um desafio que exigiu muito comprometimento. O que do trabalho suscitará discussões ainda é difícil dizer, pois ainda não o vi com distanciamento. Com certeza a questão estética é uma das entradas fortes de discussão, os diferentes estilos e procedimentos. Acho também que a exposição consegue discutir a ideia curatorial com abordagens bem especificas. Acho que o Pappalardo tem uma distancia criteriosa com a cidade. De alguma forma ele planifica São Paulo, constitui uma cidade sem sombras, como formas que se acumulam sem permitir distanciamentos entre elas. O Mauro faz uma fotografia que não sabemos ao certo se ele fala de um passado ou mesmo de um futuro catastrófico. As fotos dele ne P&B granulado nos colocam em algum intermédio de tempo, no qual fica difícil de saber se a São Paulo que constitui já é ruína, ou se ele antecipa um future esmaecido pela impossibilidade que essa cidade teria de se realizar. Acho que fico no meio, e me debruço nas pessoas. E são a gente da cidade, de uma lado de sua história que não admite vencedores.

Várias das imagens suas que aparecem na exposição são de projetos anteriores, certo? Alguma foi feita especificamente para a exposição? Se sim, quais?

As fotos são feitas para o Ver do Meio. Em alguns momentos, usei fotos da pesquisa em aplicações imediatas, na medida que era solicitado. É como você estar estudando um assunto amplo e te pedirem um texto breve sobre um aspecto, ou um recorte. Foi o faz, usando um momento do que desenvolves. Tem fotos no Ver do Meio que foram usadas também no projeto que fiz com a Magnum e com o IMS.

Quem são hoje as suas principais referências na fotografia, no Brasil e lá fora? Por quê?

São os pesquisadores teóricos. Filósofos, professores. Muito mais que fotógrafos. Me emociono muito quando encontro a fotografia como campo conceitual. E sou um público na espera por gente nova, desse eu ainda serei fã.

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